Mia, uma cadela golden retriever de 11 meses, foi descoberta morta e enterrada no quintal de um hotel para cachorros na zona oeste do Rio de Janeiro. O local era administrado por um adestrador que alegava que o animal havia fugido. Após desmascarar a farsa e o suposto crime, a família busca Justiça.
A situação gerou indignação e levou a investigações após a família começar a duvidar da versão apresentada pelo responsável pelo hotel. Para descobrir o que realmente aconteceu com Mia, um detetive particular foi contratado.
A Polícia Civil identificou negligência e maus-tratos, resgatando outros animais em condições precárias.
Francine Branchi, de 33 anos, tutora de Mia, relatou ao portal UOL que havia confiado o adestramento da cadela a Mário Sérgio Dornelas. A família foi apresentada ao hotel por uma veterinária amiga, que atendia animais levados por Dornelas e mostrou fotos do estabelecimento. Como iriam viajar e não podiam levar Mia, decidiram confiar no espaço, que parecia adequado e bem cuidado.
O local contava com uma piscina, que era uma das paixões da cadela. Assim, após a estadia temporária, a família aceitou a proposta de adestramento por 30 dias. Segundo Francine, Mia sofria de dermatites devido à exposição excessiva à água na piscina de casa.
O controle dos banhos era vital para sua saúde, e ela precisava aprender a não entrar na piscina o tempo todo. “Ela amava a piscina. Se deixássemos, passaria o dia inteiro dentro d’água“, disse a tutora.
A devolução de Mia foi adiada novamente, mas a família não suspeitou de imediato. Inicialmente, após o período de 30 dias, Dornelas pediu mais 15 dias, alegando que Mia ainda precisava de ajustes comportamentais. Ele enviava fotos e mantinha contato frequente, criando a ilusão de que tudo estava bem com o animal. “Ele tinha um poder de convencimento muito bom. Você acreditava no que ele falava“, comentou Francine.
No dia 13 de fevereiro, véspera da data marcada para a devolução, o adestrador ligou informando que Mia havia fugido. Ele afirmou ter deixado o portão aberto e que todos os cães haviam escapado, mas apenas Mia continuava desaparecida. “Acreditei por algumas horas, mas algo não fazia sentido. Ele dizia que todo mundo estava ajudando a procurar, mas ninguém no bairro sabia dessa fuga“, relatou a tutora.
Após algumas horas, Francine começou a perceber que o adestrador apresentava um comportamento suspeito. Ele se mostrava distante e pouco comprometido com a busca, além de ter contradições em suas declarações. “Ele me disse: ‘fica tranquila, ela não vai morrer atropelada, porque está muito esperta’. Aquilo me arrepiou. Ele falava como se não fosse um problema, como se não tivesse culpa nenhuma“, recordou Francine.
Detetive particular
A família optou por investigar o caso por conta própria e decidiu contratar um detetive particular. As gravações das câmeras de segurança mostraram que Mia não estava na rua no horário mencionado pelo adestrador.
Os vizinhos também informaram que não notaram nenhuma atividade suspeita. “Foi aí que tivemos certeza de que algo pior tinha acontecido“, afirmou a tutora.
A confirmação da morte veio quando uma ativista dos direitos dos animais gravou diálogos com o suspeito, que admitiu que Mia estava enterrada em seu quintal. Ele alegou que a cadela havia morrido de hipertermia, um superaquecimento corporal. Logo depois, tentou ocultar o corpo, buscando sustentar a versão de que ela havia fugido.
Francine recorda a angústia ao chegar na casa onde Mia estava.
Quando eu vi aquele lugar, meu coração apertou. Era um quadrado de cimento, sem água, sem comida, sem nada. Eles dormiam no meio das próprias fezes. Não tinha como um cachorro sobreviver ali comentou.
No local, as autoridades encontraram mais três cães abandonados, sem comida ou água e vivendo em condições insalubres. A situação era alarmante, e os animais estavam anêmicos e fracos. A casa não tinha condições adequadas para operar como um hotel canino.
A Mia morreu por descaso. Se ela teve hipertermia, foi porque ficou horas ali, sem nada. Ele simplesmente a abandonou declarou Francine.
A tutora compartilhou sua dor pela perda e a indignação ao descobrir o que aconteceu com Mia. “Tudo lembra ela. As redes de segurança que ela comeu, o portãozinho que ela conseguiu furar, tudo. A dor é enorme, mas a Justiça vai ser feita“, afirmou.
Apesar da tristeza, a família conseguiu resgatar um dos cães encontrados na residência. “Ontem resgatamos o Dom, um golden retriever que estava lá. Ele estava anêmico, apático, mas agora está aqui, no ar-condicionado, sendo amado. Ele nunca vai substituir a Mia, mas, de alguma forma, ela salvou a vida dele“, contou a tutora.
Francine reafirma seu compromisso de lutar pelo caso. Francine declarou que continuará batalhando para que o caso não caia no esquecimento. “A Mia morreu, mas salvou outras vidas. Essa foi sua missão“, disse. “Vamos lutar até o fim para que ele pague por isso e para que outros animais não passem pelo mesmo sofrimento.”
Legislação prevê punição para maus-tratos. O artigo 32 da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98) determina que qualquer pessoa que cometa maus-tratos contra animais, sejam eles domésticos ou selvagens, pode enfrentar uma pena de detenção que varia de três meses a um ano, além de possíveis multas. Se os maus-tratos resultarem na morte do animal, a pena pode aumentar para um a três anos de detenção, juntamente com a multa. Fatores agravantes como o uso de crueldade extrema, práticas que caracterizem tortura ou ocultação de cadáver podem resultar em penas mais severas.
Posicionamento da Polícia Civil
De acordo com a Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente e a 43ª DP (Guaratiba), os responsáveis por um cachorro da raça “golden retriever” informaram que deixaram o animal no local e receberam uma chamada comunicando que o cachorro havia fugido do hotel.
Os investigadores iniciaram as buscas e, após analisarem as imagens das câmeras de segurança, perceberam que o depoimento do proprietário do estabelecimento apresentava contradições.
Durante as investigações, os policiais foram ao local e descobriram o corpo do cachorro enterrado, além de mais três cães em condições suspeitas de maus-tratos.
O dono do estabelecimento comercial enfrentará acusações por maus-tratos a animais e afirmou que se apresentará na delegacia acompanhado de seu advogado.
Não hesite em denunciar a violência contra animais. As denúncias podem ser realizadas através do número 190, em casos de necessidade imediata ou socorro rápido. Também podem ser feitas diretamente ao Ministério Público, pelo site do MP ou pelas ouvidorias dos Ministérios Públicos estaduais. Ainda é possível registrar um boletim de ocorrência em qualquer delegacia de polícia, inclusive eletronicamente em alguns estados.
