Nesta terça-feira, 28, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que impõe um imposto de 20% sobre compras internacionais de até US$ 50.
Especialistas alertam que o custo final ao consumidor pode exceder esses 20%, uma vez que o imposto incide sobre a importação e não sobre o preço final de venda.
Como exemplo, uma calça jeans feminina, atualmente vendida por R$ 53,99, poderá custar até R$ 66,71 com a nova taxação, conforme cálculos de tributaristas consultados.
O projeto também estipula um imposto de 60% para compras entre US$ 50 (aproximadamente R$ 250) e US$ 3.000 (cerca de R$ 16.500), mas oferece um desconto de US$ 20 (aproximadamente R$ 110) no imposto a ser pago.
A empresa Shoppe, que será afetada pela mudança, declarou nesta quarta-feira, 29, que apoia a medida e prevê que não haverá impacto significativo para seus consumidores.
Esta taxação foi inserida como um “jabuti” no projeto de lei 914/24, que cria o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover).
Este programa, segundo informa a Câmara, destina-se a fomentar com R$ 19,3 bilhões ao longo de cinco anos a pesquisa e desenvolvimento de soluções tecnológicas e a produção de veículos menos poluentes.
Anteriormente, em agosto do ano passado, o programa Remessa Conforme havia isentado de impostos as compras internacionais de até US$ 50 feitas por pessoas físicas.
Esta isenção se aplicava às empresas que aderissem ao programa, que visa regularizar tais transações. Agora, o projeto de lei com o “jabuti” será encaminhado ao Senado para apreciação.
Se aprovada, essa mudança na taxação afetará diretamente as compras feitas em sites internacionais como Shein e Shopee.
Novos custos de importação
As empresas importadoras começam a ter uma tributação parecida com a com os produtos brasileiros, tendo 18% de ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) mais 20% da tributação sobre a importação explica André Félix Ricotta de Oliveira, doutor e mestre em Direito Tributário pela PUC/SP e presidente da Comissão de Direito Tributário e Constitucional da OAB/SP – Pinheiros
Para avaliar o impacto dessa nova política tributária no bolso dos consumidores habituados a fazer compras internacionais, conversamos não apenas com Oliveira, mas também com Edison Fernandes, sócio do escritório Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados e professor da FGV, e Claudio Carneiro, advogado tributarista, pós-doutor em direito e professor de direito tributário.
Oliveira e Fernandes realizaram simulações de cálculos para cinco dos produtos mais importados pelos brasileiros, de acordo com dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
Além do preço da calça jeans feminina já mencionado, os brinquedos figuram como uma das categorias de produtos mais adquiridas.
Por exemplo, um boneco do personagem Deadpool, que atualmente custa R$ 88,88, passará a custar, no mínimo, entre R$ 106,66 e R$ 109,26 ao consumidor final. Abaixo, confira outras simulações, mas lembre-se de que o valor final pode ser ainda maior, pois o imposto incide sobre a importação e não sobre o preço final de venda.
Calça jeans feminina
- Valor atual: R$ 53,99
- Quanto ficará: de R$ 64,79 a R$ 66,71
Boneco do personagem Deadpool
- Valor atual: R$ 88,88
- Quanto ficará: de R$ 106,66 a R$ 109,26
Lapiseira escolar grafite 0.7 mm
- Valor atual: R$ 8,99
- Quanto ficará: de R$ 12,22 a R$ 19,79
Robô aspirador
- Valor atual: R$ 119,90
- Quanto ficará: de R$ 143,88 a R$ 145,56
Pilhas (pack com 4)
- Valor atual: R$ 22,69
- Quanto ficará: de R$ 27,23 a R$ 28,91
“Consumidores terão de comparar preços”
A variação nos preços ao consumidor, como mencionado anteriormente, ocorre porque é difícil para os tributaristas antecipar como as empresas reagirão à nova legislação. Conforme informado no site da Shopee, que foi usado para a pesquisa de produtos nesta reportagem, o frete é oferecido gratuitamente para certas localidades.
Essa taxação refere-se ao imposto de importação. Isso quer dizer que o valor de 20% aumentará o custo do produto quando chegar ao Brasil. Os produtos importados, então, ficariam mais caros em pelo menos 20%; entretanto, o impacto para o consumidor dependerá da postura da empresa importadora: se ela repassar esse custo, aumentará o preço final do produto para o consumidor; mas a empresa pode assumir esse custo, reduzindo seu lucro e, dessa forma, mantendo o preço ao consumidor explica Edison Fernandes
Claudio Carneiro alerta que o impacto financeiro para o consumidor pode ser ainda maior.
Atualmente, as compras de importados online são tributadas apenas pelo Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), cujos 17% têm como destino os cofres estaduais. Assim, com a aprovação, aos valores originais serão somados: os 20% + 17% de ICMS. Ou seja, representará um aumento de 37% sobre o valor original detalha
André Félix Ricotta de Oliveira aponta que a nova taxação coloca as empresas brasileiras em uma situação mais competitiva em relação aos importadores. “pé de igualdade”
Os consumidores de produtos importados terão que fazer essa comparação de preços afirma
Perspectivas sobre judicialização
A discussão sobre a possibilidade de judicialização da nova taxa de 20% sobre importações está em aberto entre os especialistas, caso a medida seja aprovada definitivamente pelo Senado e sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Essa taxação resulta de um compromisso com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que negociou o percentual como um meio-termo, visto que alguns parlamentares defendiam uma taxa de 60% para as compras internacionais de pequeno valor.
Dos três tributaristas consultados, Carneiro e Fernandes não veem grandes possibilidades de judicialização dessa questão.
No entanto, Oliveira apresenta uma perspectiva diferente. Ele aponta que o acréscimo desta taxação no projeto de lei do Programa Mobilidade Verde e Inovação, que foca na descarbonização da indústria automobilística, pode ser problemático.
Oliveira sustenta que essa inclusão é um exemplo de “jabuti”, ou seja, uma inserção que pode comprometer a integridade procedimental da legislação.
Segundo Oliveira, este acréscimo viola os princípios estabelecidos pela lei complementar 95, de 26 de fevereiro de 1998, que regula a elaboração e redação das leis.
O fim da isenção dos produtos importados até US$ 50 foi tratado num projeto de lei que estabelece o Programa Mobilidade Verde e Inovação, que dispõe sobre a descarbonização da produção de veículos. Esse jabuti é um vício de procedimento na lei. Prego que há vício formal na lei argumenta Oliveira
Shopee apoia novo imposto de importação
Nesta quarta-feira, a Shopee expressou seu apoio ao novo imposto de importação de 20%, através de um comunicado oficial.
Presente no Brasil desde 2019, a empresa destacou seu compromisso com o fomento ao empreendedorismo local, enfatizando que 90% das suas vendas no país são realizadas por vendedores nacionais.
A Shopee ressaltou seu foco no desenvolvimento do ecossistema de comércio eletrônico brasileiro.
Não haverá impacto para o consumidor que comprar de um dos nossos mais de 3 milhões de vendedores nacionais que representam 9 em cada 10 compras na Shopee no país afirmou a empresa em sua nota
A empresa também garantiu que os consumidores não sentirão impacto nas compras feitas de seus mais de 3 milhões de vendedores nacionais, que representam 90% das transações no site.
Quando questionada sobre a manutenção dos preços, considerando que alguns lojistas da plataforma importam produtos para venda, a Shopee respondeu que mais de 85% dos produtos oferecidos por vendedores brasileiros são produzidos localmente.