Outro dia li um texto de um jovem escritor relatando o drama vivido quando um texto não ia para frente. Quando as ideias acabavam. Quando não conseguia mais criar. Ah, eu pensei, talvez isso aconteça porque não seja a hora do texto. Todo texto tem sua hora e muita gente abusa disso.
Me lembrei de um conto meu que está parado há semanas. Ele começa com uma espingarda e eu me levantei da cadeira em meio a um almoço e não voltei mais. Deixei-o descansar e um dia, ao me deitar, a estória toda me veio. Com partes até mesmo engraçadas. Eu me peguei rindo com o que ainda não escrevi.
Escrever é amar, escrever é mais que combinar sujeito com advérbio, com verbo transitivo ou intransitivo. É mais que pontuação.
A ideia de que o escritor (autor) é independente de seus personagens é irreal e confortável para quem escreve, mas não é lá muito verdadeira. Tem muita gente escrevendo coisas ruins ou melhor não construtivas, plantando uma sementinha na cabeça de quem lê não muito fortuita e lavando as mãos. Quando lemos um livro passeamos pela cabeça de quem o escreveu. Percebi isso depois de ler a maravilhosa Rosamunde Pilcher e sentir toda tarde uma vontade incontrolável de chá. Tomei chá por dias seguidos enquanto lia seus textos. Depois passou, logo que terminei de lê-la. A experiência me pareceu muito com as vontades que nos abraçam durante a gestação.
Tem muita gente que se identifica com personagens, eu me identifico com autores. Conheço cada um deles pelo que escrevem. Posso afirmar que passear pela cabeça de Marcelo Rubens Paiva não me agradou nem um pouco, eu não gostaria de conhecê-lo, já Rubem Braga me acolheu confortável em suas letras. Vivemos muitas vidas em uma vida e a escrita eu carreguei comigo em todas elas. Quando criança com as primeiras palavras rabiscadas, quando adolescente com contos cheios de drama e quando adulta com o que há de melhor em mim. Não vou perder uma noite aflita por não escrever simplesmente porque não lhe tiram o que é seu e o que ama fazer.
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Não se afligem com as letras aqueles que o fazem por amor, se afligem os que o fazem por qualquer outra coisa.
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