A geração Z encontra-se diante de um curioso desafio. Esses jovens, que começaram a nascer em 1995, foram criados num mundo digital, familiarizados com as tecnologias mais modernas como smartphones e tablets.
Contudo, muitos mostram-se surpreendentemente inexperientes com tarefas fundamentais em computadores tradicionais.
Muitos jovens na faixa dos vinte anos encontram dificuldades para realizar tarefas simples em um PC, como formatar um documento no Word ou usar comandos básicos como Ctrl C + Ctrl V. Essas limitações têm se tornado mais aparentes à medida que ingressam no mercado de trabalho.
Confesso que não sei formatar textos no Word ou mexer no PowerPoint. No Excel, menos ainda compartilha Laís Brito, uma estudante de medicina de 20 anos, de Criciúma (SC), em conversa com a Tilt
Laís conta que manuseia celulares desde os 5 anos de idade e recebeu seu primeiro smartphone touchscreen aos 11 anos.
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– Direitos autorais: Reprodução / Arquivo pessoal
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Embora tivesse um computador em casa e o usasse bastante para jogos e para criar fanfics que postava nas redes sociais, o uso mais avançado do PC nunca fez parte de sua rotina escolar.
Nunca tive aula de informática, nunca vi a necessidade disso. E nunca mexi com computador na escola, não sei se é porque venho de uma escola pública, mas nunca precisamos de uma formação mais adequada em Word, porque não pediam formatação específica, texto justificado. Agora, fazendo TCC, estou com dificuldade e isso está me atrasando bastante diz Laís Brito
Como estagiária em um ambulatório, Laís Brito relata enfrentar desafios no trabalho devido a sua limitada habilidade em informática.
Ela tem dificuldade, por exemplo, em operar o sistema da empresa no computador ou em digitar rapidamente no teclado.
Laís observa que seus colegas da mesma faixa etária também lutam com a tecnologia.
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Eles digitam muito lento, muito lento disse ela em um vídeo no TikTok
A jovem nota até diferenças dentro de sua própria casa:
Meu pai digita rápido
Além disso, Laís menciona uma frustração comum no ambiente de trabalho:
O pior é que os funcionários mais velhos sempre recorrem aos estagiários para resolver problemas técnicos no computador, com a ilusão de que somos superentendidos no assunto. Quando não sabemos o que fazer, acham que é má vontade nossa expressa Relata Laís Brito, de 20 anos
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Choque geracional no trabalho
João Pachu, de 27 anos, escrevente em um cartório de Jundiaí, interior de São Paulo, vivenciou diretamente o choque geracional. Ele compartilha uma experiência onde teve que orientar uma jovem aprendiz, de aproximadamente 18 anos, que desconhecia o comando Ctrl C + Ctrl V.
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Em determinado momento, eu disse: ‘Pega esse arquivo e dá um Ctrl C + Ctrl V’. E foi como se eu tivesse falado em código. Ela me olhou e falou: ‘Como assim?’. Então, eu respondi: ‘É, copiar e colar’, e mostrei a ela o que era o comando. Foi como se eu tivesse feito uma feitiçaria na frente dela relata João
Artur Andrades, 33 anos, ocupando uma função administrativa na Prefeitura de Botucatu, também no interior de São Paulo, enfrentou um desafio similar com um estagiário de 18 anos que tinha dificuldade até para acessar o email.
Logo no início, ele não sabia que precisava clicar duas vezes no ícone do Google Chrome para abrir a internet
Ele levou mais de uma hora para concluir a tarefa, entre acessar o email, escrever, fazer os ajustes finais e enviar conta Artur
Outra situação foi enfrentada por Thiago Berton, 39 anos, líder na Johnson & Johnson em São José dos Campos (SP), com um estagiário que não compreendia tarefas básicas como montar uma apresentação no PowerPoint ou operar uma impressora.
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Thiago, que também é pai de uma adolescente de 18 anos, decidiu refletir mais profundamente sobre essas questões.
Ele escreveu um artigo no LinkedIn onde discute a importância de ter empatia pelos mais jovens e sugere abordagens mais lúdicas para o ensino de habilidades básicas de informática, incentivando os mais velhos a entender e ensinar os mais novos com paciência e criatividade.
Existem fatores que vão além dos estereótipos clichês que costumamos ouvir, do tipo:
Ah, essa geração tem ‘preguiça’. Não é preguiça. Há fatores geracionais e culturais envolvidos. Nossa geração tinha de correr atrás da informação, coisa que eles não precisam fazer conta Thiago Berton
Mudança de Mentalidade
A dificuldade dos jovens da geração Z com computadores não é apenas uma questão de falta de familiaridade ou ausência de educação formal em informática, explica Thais Giuliani, autora de “Geração Z e o Modelo de Aprendizagem Zímago”. Segundo ela, o desafio é mais profundo.
A facilidade proporcionada pelo digital naturalmente moldou o comportamento dessa geração, que tem tudo em mãos de forma fácil e rápida. A geração X, por exemplo, precisava buscar conhecimento na biblioteca, algo impensável nos dias de hoje. Atualmente, existem ferramentas de inteligência artificial que montam uma apresentação no PowerPoint sem que a pessoa precise dominar o programa afirma Thais Giuliani
Giuliani observa que há variações significativas dentro da própria geração Z, influenciadas por idade e classe social.
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Jovens de estratos socioeconômicos mais elevados, por exemplo, tendem a incorporar mais rapidamente os traços característicos da geração Z, beneficiando-se das facilidades tecnológicas sem necessidade de esforço excessivo.
Para Giuliani, as últimas décadas trouxeram uma transformação no mindset.
É comum ouvir frases do tipo: ‘Essa geração faz corpo mole, não se esforça, quer tudo mastigado’. Mas essa visão não condiz com a realidade
Os jovens não simpatizam com a cultura ‘workaholic’, não querem adoecer e tomar remédio controlado. Eles querem viver pelo propósito, trabalhar com o que gostam destaca Thais Giuliani
Essas diferenças geracionais podem gerar tensões no ambiente de trabalho. De acordo com o relatório “Tendências de Gestão de Pessoas” da Great People & GPTW, uma consultoria global, 68,1% dos gestores enfrentam desafios ao interagir com membros da geração Z nas empresas. A pesquisa contou com a participação de 1.864 profissionais, em sua maioria gerentes.
Giuliani ressalta que cada geração possui suas forças e fraquezas. No caso da geração Z, destacam-se a solidariedade e empatia.
No entanto, a acessibilidade constante a recursos pode atrofiar o desenvolvimento de habilidades como a inteligência emocional.
A especialista acredita que as empresas devem se preocupar em entender essas limitações e trabalhar de maneira construtiva para auxiliar o desenvolvimento desses jovens no ambiente profissional, enfatizando que a falta de habilidades básicas de informática é apenas “a ponta do iceberg”.