A Casa de Repouso Outono, localizada na Rua Florianópolis, no bairro da Praça Seca, Zona Oeste do Rio, foi fechada por equipes do Instituto Municipal de Vigilância Sanitária, Vigilância de Zoonoses e de Inspeção Agropecuária (Ivisa), da prefeitura, e por agentes da Delegacia Especial de Atendimento à Pessoa da Terceira Idade (Deapti) na manhã desta sexta-feira por “graves irregularidades”.
De acordo com o delegado titular Gilberto da Cruz Ribeiro, idosos passavam fome no local e pediam para morrer, de tanta dor que sentiam.
“A situação é extremamente grave. Encontramos uma idosa subnutrida, um idoso que clama pela morte porque está sentindo muito dor, além de infestação de sarna. O asilo está lacrado. Ele foi interditado e vamos conduzir os responsáveis para a delegacia. Essa operação é motivada por uma notificação da Justiça do Trabalho” —afirmou Gilberto.
Ainda segundo o delegado, o asilo abrigava 32 idosos. Na semana passada, dois deles morreram. Uma investigação foi aberta para apurar a causa das mortes.
O delegado disse que está entrando em contato com os parentes das outras pessoas que continuam na casa de repouso para que busquem seus familiares. Caso algum deles não tenha com quem ficar, será levado para um abrigo público.
Maria Cláudia Castelo, gerente do seguimento asilo e casa de recolhimento do Ivisa afirmou que o local não tinha condições de funcionar. Além de não ter medicação para os idosos, não havia alimentação adequada. Os hóspedes estavam se alimentando nos últimos dias apenas com arroz, feijão e ovo.
“Recebemos um ofício, já transitado e julgado, para fechar essa casa por conta de tributos fiscais. Nós do Ivisa, viemos para fazer a fiscalização e ela confirmou que devia ao fisco. Na fiscalização vimos que havia 32 idosos na casa, sendo três em estado grave. Muitos deles com escaras, secreção, estado de saúde precário e 100% deles com sarna. Fomos olhar a lavanderia e dentro do lixo havia roupas limpas misturadas com roupas sujas. Olhamos a cozinha e estava desabastecida. Hoje só tinha arroz, feijão e ovo. Não tinha cardápio, não tinha enfermeira, não tem evolução da ferida dos idosos. Se não tem essa evolução, como os idosos são avaliados? Por isso, por conta do risco sanitário, e além do mandado, interditamos por condições insalubres” — conta a profissional da Prefeitura do Rio.
Dos idosos, três deles foram retirados em estado grave e levados para hospitais da região em ambulâncias do Samu.
“Uma idosa está totalmente emagrecida, tem uma ferida por lesão de escaras nas costas, secreção e com sarna. Essa senhora está em estado deplorável sem avaliação médica e clínica. Ao todo, três estão sendo removidos. Eles não foram providos de atendimentos médicos adequados”.
Além de não terem tratamento adequado, os moradores do local não tomavam as medicações corretas.
“Várias medicações desses idosos estavam suspensas porque não havia na casa, e isso é muito grave. Muitos não estavam tomando remédio. Se a casa não tem medicação a ser prescrita e a família não vai trás, é a casa que tem que providenciar. Pegamos mais de dez idosos sem medicação, porque não tinha” — disse Maria Cláudia Castelo, que completou:
“Essa clínica foi lacrada por notificação da Justiça do Trabalho. Entretanto, como ela oferecia riscos à saúde desses idosos, está sendo multada no artigo 25 (direito à saúde, bem estar e segurança) por transgredir normas e valores e uma interdição total. São duas multas que chegam a R$ 9 mil. Essa casa tem 72 horas para retirar os idosos”.
A Casa de Repouso Outono já foi fiscalizada antes e não tinha problemas.
“Por conta da Covid, a gente está intensificando as visitas porque os familiares deixaram de vir e as coisas “degringolaram”. Você observa que mudaram as questões das clínicas. Tem idoso que paga R$ 5.500 por mês. Aqui vai de R$ 2.800 até mais de R$ 5 mil” — ressaltou Maria Cláudia.
Cadastramento de idosos
O aposentado Jorge Conceição Lima, de 73 anos, conta que a irmã de 67 e com Alzheimer, está no asilo desde janeiro deste ano. Ele lembrou que a família não era permitida a entrar no local e, durante as visitas, ficavam em um espaço fora dos quartos.
“Toda quinta-feira eu estou aqui. Então eu via a minha irmã emagrecendo muito. Cheguei a perguntar o motivo de uma coceira muito grande no braço e eles disseram que era normal. A gente não imaginava que era assim. Não tínhamos acesso à casa. Faça chuva ou sol ficávamos no espaço de entrada da casa. Eu vi a situação hoje e é muito triste” — disse. Lima acrescentou que o ex-cunhado que vai definir para onde ela vai.
Sobrinha da idosa, a consultora de venda Thais Lima, de 47 anos, soube por uma amiga que a clínica onde a tia morava havia sido interditada.
“Uma amiga me disse que estavam fechando a casa de repouso e liguei para os meus pais. Chegando aqui, vimos a situação dela” — concluiu.
A dona de casa Shirlene da Silva, 52, tem a mãe Marlene da Silva Leal, de 76, internada no espaço há pouco menos de um ano. Ela conta que a proprietária da clínica pressionava para que a família não deixasse de pagar para que a idosa não fosse expulsa do asilo.
“Eles ficavam pressionando dizendo que, se a gente não pagasse, teríamos que tirá-la daqui. A minha mãe está aqui há pouco menos de um ano. Pagamos aqui R$ 2.800 mensal. Somos nove filhos e cada um pagava cerca de R$ 300,00. Antes de vir para cá, ela morava na casa da minha irmã em Bangu, e por falta de condições, achamos aqui. Vimos uma estrutura maravilhosa. Mas não imaginávamos que ela sofria assim. A minha mãe não fala e não anda. Mas elas (funcionárias) falavam que a minha mãe fazia pirraça e não gostava de tomar banho. Nos últimos meses a minha mãe estava muito nervosa e eu não entendia. Será que ela sofria maus-tratos?” — questiona Shirlene.
A dona de casa também lembra que ficou sabendo do fechamento pela prefeitura.