O caso aconteceu em Ouro Preto, e o estudante tinha acabado de ingressar em engenharia, mas depois do ocorrido acabou trancando o curso.
Existem vários ritos de passagem que encaramos ao longo da vida, e alguns deles são dentro das próprias instituições educacionais sempre que avançamos em séries. A formatura do pré, do ensino fundamental e do ensino médio, por exemplo, marcam a vida dos estudantes, e muitos almejam sair dessa esfera e partir para as universidades, onde acabam desempenhando um papel ainda mais ativo na sociedade.
As faculdades possuem seus próprios ritos, e durante muitos anos, os calouros (como são chamados os alunos que acabaram de entrar nos cursos) passam por trotes como forma de conhecer a comunidade e comemorar aquele momento tão diferente, que culmina também na saída da adolescência e ingresso na vida de jovem adulto. Nos últimos anos, as próprias instituições de ensino superior passaram a barrar os trotes universitários violentos, conscientizando e pedindo que os alunos fizessem programações mais culturais e que não colocassem em risco a vida de nenhum membro local.
Mas não foi isso que Ayrton Carlos Almeida Veras passou quando ingressou em engenharia na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). De acordo com reportagem ao Jornal Nacional, no início deste ano, ele foi morar na República Sinagoga, que faz parte de uma das 59 moradias da faculdade. Essas moradias estudantis são casarões localizados no Centro Histórico de Ouro Preto e acabam sendo administrados pelos próprios estudantes que moram no local.
Assim que entrou na universidade, Ayrton explica que passou meses enfrentando uma “batalha”, que consiste em desafios diários que os calouros precisam enfrentar para provar que merecem morar nos casarões. Ele conta que foi aprovado pelos veteranos da Sinagoga, mas que ficou em coma depois de uma festa que foi realizada em comemoração à conquista. A mãe da vítima, Regina Araújo Veras, explica que o filho acabou sofrendo um violento trote universitário durante o evento.
De acordo com ela, os estudantes sofrem uma forte pressão psicológica, como se fosse uma espécie de lavagem cerebral. O filho teria ingerido três copos americanos de cachaça ou pinga, e depois mais três copos americanos de óleo, molho de pimenta e molho shoyu misturados. Depois, os veteranos teriam jogado água gelada nele com pós de café em um balde, e logo depois do banho o jovem teria entrado em coma.
Ayrton foi imediatamente encaminhado à UPA de Ouro Preto, e os médicos apontam que ele chegou com indícios de que tinha exagerado na bebida. Devido ao estado de saúde do jovem, o médico que prestou atendimento inicial acionou a polícia, isso porque também existem indícios de que ele tenha sofrido abuso sexual, mas os exames que comprovam a questão ainda não foram encaminhados à família.
Durante oito dias, Ayrton ficou na UTI da Santa Casa de Ouro Preto, permanecendo internado por 16 dias. Desde que saiu do hospital, o estudante alega que faz tratamento para lidar com as sequelas do seu caso, que incluem crise de ansiedade, queda de cabelo, problemas cardíacos e perda do movimento de um dos pés.
Ayrton trancou a matrícula na faculdade e voltou para sua cidade natal, Maranhão, mas deseja Justiça, e pede que a UFOP tome providências o quanto antes. De acordo com o jovem, seu caso não é isolado, e muitos outros estudantes acabam passando por tratamentos similares, sendo humilhados diariamente.
A UFOP enviou uma nota alegando que o trote universitário é proibido dentro do campus, de acordo com a Resolução Cuni nº 1.870. “A prática de trote na universidade pode implicar na aplicação de penalidades de advertência, suspensão ou desligamento dos estudantes envolvidos. Sendo assim, a universidade reforça a importância de as denúncias serem realizadas pelos canais oficiais da Ouvidoria. Para que seja aberto um processo administrativo, estudantes e servidores devem enviar a denúncia pela plataforma Fala.BR.”
A República Sinagoga emitiu uma nota de esclarecimento nas redes sociais, e alega que a denúncia é falsa, não existindo nada que comprove que ocorreu. “Inicialmente, esclarecemos que as alegações são inverídicas e que foram publicadas de forma irresponsável pelo jornal, que não se incumbiu de verificar a realidade dos fatos, reproduzindo deliberadamente acusações sem respaldo probatório como se verdade fossem.”
“A República Sinagoga repudia veementemente a prática de trotes e quaisquer abusos na comunidade acadêmica, reiterando seu compromisso com as regras institucionais do sistema republicano. Informamos também que as medidas cabíveis já estão sendo tomadas para elucidar os fatos e coibir a disseminação de notícias falsas”, finalizou a nota.