Durante uma sessão da 7ª Turma Cível da 2ª Câmara do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), um advogado de 30 anos foi impedido de fazer a defesa de seu cliente devido ao uso de vestimentas e adereços do candomblé, uma religião de origem africana.
O incidente ocorreu no Dia do Orgulho LGBTQIA+, em 28 de junho. O advogado, Gustavo Coutinho, estava prestes a fazer a sustentação oral de um processo de segunda instância relacionado a um caso de homofobia. Na ocasião, Coutinho vestia um terno branco, suas guias e seu eketé, uma espécie de chapéu. Essa vestimenta é obrigatória durante um período de três meses, conhecido como resguardo, para os iniciados na religião.
Em entrevista ao Terra, Coutinho relatou que chegou a usar a tradicional beca preta fornecida pelo tribunal, mas quando se aproximou do microfone para falar, foi impedido. Ele recorda: “O desembargador do processo pediu uma questão de ordem, porque nas palavras dele, eu estava desrespeitando a corte com as vestimentas”.
O desembargador em questão é Fabrício Fontoura Bezerra. De acordo com Coutinho, o magistrado teria afirmado que os advogados devem estar vestidos de forma formal, em respeito à liturgia da Corte. O advogado relata: “[Falou] que era extremamente católico, mas não era preconceituoso com religião ou raça”.
Além disso, o desembargador fez uma comparação entre essa situação e a de um advogado que estava fazendo a sustentação oral enquanto dirigia. Para não prejudicar seu cliente, outra advogada presente assumiu a defesa.
“Me senti tendo os meus direitos cerceados, uma vez que não pude exercer a minha advocacia. Foi colocado como se eu não tivesse declinado da palavra, mas não foi isso”, explica.
Logo após o encerramento da sessão, Coutinho acionou a Comissão de Prerrogativas da OAB/DF. Ele planeja enviar uma manifestação à Comissão Nacional da Justiça (CNJ) e também entrar com uma ação cabível.
Ao consultar o regimento interno do TJDFT, constata-se que não há indicações sobre cores ou símbolos proibidos durante as sessões. O documento apenas estabelece que os advogados devem “ocuparão a tribuna usando capa ou beca, além do traje civil completo”.
Em comunicado, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) informou que não irá se manifestar sobre o assunto.
O juiz Fabrício Fontoura Bezerra, por sua vez, declarou ao Terra que o advogado estava vestindo “apenas calça e camisa brancas, além de um turbante, portanto, sem o uso de terno e de gravata, ou de vestes talares”, e na ocisão, o magistrado “lembrou a tradição da vestimenta e a existência regimental do uso da capa ou beca, além do traje civil completo, nos termos do art. 101 do RITJDFT”.
“Além disso, destacou o respeito às religiões e ao eventual acolhimento de entendimento contrário pelo Colegiado, que naquela oportunidade ouviu atentamente as explicações dos envolvidos. No entanto, a 7ª Turma Cível decidiu, à unanimidade, pela necessidade do traje formal, em atenção à regra regimental”, declarou.
O desembargador também afirmou que foi garantida ao advogado a oportunidade de apresentar um áudio para ser ouvido em sessão pelos desembargadores votantes, conforme confirmado por Coutinho em entrevista. “Ou mesmo o adiamento do julgamento para depois do período em deve usar as vestimentas próprias da religião escolhida, porém, considerando que ainda deverá usá-la por três meses, declinou a sugestão e repassou a exercício da palavra à dra. Maria Victoria Hernandez Lerner”.
O magistrado reforçou que, dessa forma, foram observadas as leis aplicáveis ao caso, o princípio do contraditório e a decisão do colegiado, que entendeu que não houve prejuízo ao exercício da advocacia ou ao princípio do contraditório.