Nesta quarta-feira (4), a Polícia Civil de Minas Gerais anunciou a conclusão de que o acidente aéreo que resultou na morte da cantora Marília Mendonça e de sua equipe foi resultado da imprudência e negligência dos pilotos.
“Apresentamos a conclusão do inquérito com o máximo de respeito às famílias. Sabemos que foi um acidente, mas é função da Polícia Civil apontar a causa e materialidade” afirmou o delegado Ivan Lopes Sales.
A investigação constatou que a aeronave colidiu com uma linha de transmissão de energia devido à decisão dos tripulantes de prolongar a chamada perna do vento.
Esse termo se refere a uma manobra preparatória para o pouso, representando o momento em que o piloto conduz a aeronave em direção oposta à pista antes de retornar e alinhar o avião com o aeroporto.
Conforme as diretrizes do manual de voo da aeronave, os tripulantes deveriam verificar a presença de obstáculos, como colinas e linhas de transmissão, antes da decolagem, conforme relatou o delegado de Caratinga.
O Delegado Sales explicou que pelo menos três documentos deveriam ter sido consultados pela equipe. Um desses documentos não fazia menção à torre, uma vez que esta estava localizada fora da zona de proteção do aeroporto.
“Ficou evidenciado que os pilotos ultrapassaram a perna do vento, não respeitando o manual. Ao ultrapassar, saíram da zona de proteção do aeródromo. Neste caso, qualquer responsabilidade de antena, morro e obstáculos, cabia aos pilotos observar” declarou o delegado ao explicar o motivo pelo qual a aeronave estava na altura da fiação.
De acordo com o delegado Ivan Sales, o dispositivo EGPWS emite sinais sonoros de alerta à medida que se aproximam de obstáculos.
“Ele pode ser desligado à medida que a aeronave chega para aproximação do solo”, comenta.
“É fato que a aeronave se chocou com a torre de transmissão e ela não era sinalizada, mas não era obrigatória a sinalização da torre devido à altura e à distância que ela está da zona de proteção do aeródromo” esclareceu Sales.
“O alargamento da perna do vento não é vedado pela aeronáutica. Fica a critério da tripulação, mas entendemos que houve tomada de decisão equivocada de alongamento porque não tiveram ciência das cartas [de voo] e acabaram colidindo” acrescentou o delegado Sávio Assis Machado Moraes.
“Em face disso, restou evidenciar prática de homicídio culposo por parte dos pilotos. Sendo certo que, ao final do inquérito, foi sugerida a extinção da punibilidade em face da morte dos tripulantes e sugerido o arquivamento do inquérito, concluindo pela negligência e imprudência por parte da tripulação” disse Moraes.
Em um comunicado emitido após a divulgação do inquérito, o advogado Sérgio Roberto Alonso, que representa Vitória Medeiros, filha do piloto Geraldo Martins de Medeiros Júnior, expressou críticas às conclusões.
Ele afirmou que o relatório “não tem fundamento nas provas do inquérito e é até injuriosa com a imagem do Piloto e Copiloto”.
“Este acidente ocorreu porque a Cemig instalou a rede de alta tensão na reta final do aeródromo de Caratinga na altitude do tráfego padrão que é de 1000 pés, cujo aeródromo não tinha Carta Visual de Aproximação. Tanto isto é verdade que Cemig seguiu a recomendação do CENIPA, sinalizou a linha em 01 de setembro de 2023; o Descea fez a Carta de Aproximação Visual; O Descea elevou a altitude do tráfego padrão de 1000 pés, para 1350 pés, uma vês que a altitude do tráfego padrão era a mesma da linha de transmissão. Se tudo isto tivesse sido feito anteriormente, não teria ocorrido o acidente” ressaltou o advogado.
Histórico
O acidente ocorreu em 5 de novembro de 2021, na cidade de Piedade de Caratinga, localizada a 302 km de Belo Horizonte. Na ocasião, Marília estava a caminho de uma apresentação na região, e a aeronave caiu aproximadamente um minuto antes de pousar.
Todos os ocupantes perderam suas vidas. Juntamente com a artista, estavam a bordo Henrique Bahia, o produtor da cantora; Abicieli Dias, tio e assessor de Marília; o piloto Geraldo Martins de Medeiros Júnior e o copiloto Tarciso Pessoa Viana.
Um relatório preliminar, divulgado pela Polícia Civil em 5 de novembro de 2022, eliminou a possibilidade de o acidente ter sido causado por mau tempo.
As teorias que permaneceram sem confirmação apontavam para erro humano ou falha mecânica. A conclusão do inquérito estava condicionada à análise de um relatório do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), sob responsabilidade da Força Aérea Brasileira.
Em 16 de maio deste ano, o Cenipa indicou um julgamento considerado “inadequado” por parte do piloto, podendo ter sido um fator contribuinte para a tragédia. O relatório apontou um possível equívoco na decisão relacionada ao “perfil de aproximação para pouso”.
O relatório indica que “a perna do vento foi alongada em uma distância significativamente maior do que aquela esperada”. Isso poderia ter levado a aeronave a colidir com uma rede elétrica de alta-tensão, resultando na queda.
Na época, a Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) enfatizou que a fiação encontrava-se fora da zona de segurança do aeroporto.
“A regularidade da sinalização das torres de distribuição da Cemig no trecho em questão foi atestada pelo relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), que concluiu que a rede de distribuição naquele trecho (ora sinalizada) ‘não se enquadrava nos requisitos que a qualificassem como obstáculo ou objeto passível de ser sinalizado’. Ou seja, não há previsão legal para a sinalização da rede no local” comunicou a empresa.