Nathan Gouvêa, enteado do fundador da Igreja Bola de Neve, Rinaldo Luiz de Seixas Pereira, conhecido como apóstolo Rina, traz acusações graves contra o padrasto em uma recente entrevista ao portal UOL.
Nathan, que conviveu com Rinaldo desde os seis anos, relata uma infância e juventude marcadas por abusos físicos e psicológicos. As agressões, segundo ele, também se estendiam à sua mãe, Denise Seixas, que recentemente conseguiu uma medida protetiva contra Rina sob a Lei Maria da Penha
Ele é o cara do morde e assopra comenta Nathan Gouvêa, 30 anos, a respeito do seu padrasto, Rinaldo Luiz de Seixas Pereira.
Me chamava para jogar videogame. Uma vez, coloquei um CD úmido e o jogo não rodava. Para cada vez que eu tentava fazer o jogo funcionar e não dava certo, ele me dava um chute na cabeça.
A assessoria de Rinaldo respondeu ao portal UOL, negando as acusações:
O apóstolo Rinaldo Seixas nega categoricamente as falsas afirmações apontadas pelo enteado. Tem confiança de que todas as denúncias se mostrarão infundadas após as investigações e apreciação pelo Ministério Público e Poder Judiciário.
Nathan tinha apenas 6 anos quando sua mãe, a pastora Denise Seixas, casou-se com Rina. Desde então, ele desenvolveu uma relação de “pai e filho” com o padrasto — que atualmente é acusado por Nathan de cometer agressões físicas e abusos psicológicos tanto contra ele quanto contra sua mãe.
Denise obteve na Justiça uma medida protetiva de urgência sob a Lei Maria da Penha, e encontra-se distanciada do marido.
Nathan, que compartilhou nas redes sociais um vídeo onde sua mãe aparece sendo maltratada pelo marido, relata que o medo foi uma constante durante toda a sua infância e juventude. Apesar disso, ele sempre viu o religioso como uma figura paterna.
Meu pai era ausente e, quando Rinaldo começou a se relacionar com a minha mãe, passei a chamá-lo de ‘pai 2’. Coisa de criança, não tinha muita consciência. Ele não gostou e disse: ‘Não é pai 2. Você tem que me chamar de pai’. Então, nosso relacionamento passou a ser de pai e filho relata.
Eu não enxergava algumas coisas que ele já fazia comigo como ruins, mas, na verdade, como uma coisa que um pai deve fazer. Tinha 7 anos, estávamos eu e um amigo na casa de praia dançando aquela música ‘Olha a Onda’. Ele viu e ficou extremamente irritado, me bateu e deixou, eu e meu amigo, pelados numa sacada. Dava para todo mundo ver. Ficamos assim por horas.
O castigo, que Nathan considerava “normal”, aconteceu novamente.
Era bem novinho, coisa de uns 8 anos. Morávamos em um apartamento todo de vidro, no terceiro andar e, mais uma vez, ele me deixou de castigo, pelado.
Quando não estava sendo agredido, enfrentava ameaças, conta ele:
Estava fazendo muita falta [no game Fifa, um jogo de futebol] e ele se irritou. Disse que eu ia levar um soco por cada falta que fizesse. No final, não me bateu.
A mãe, recorda ele, presenciava as agressões, mas também sofria do “mesmo abuso”.
Ele sempre a tratou como escrava, e ela não se posicionava declara.
Minha mãe usava textos bíblicos para se referir ao Rina. Tem um texto que fala que Deus vai inclinar o coração do rei. É complicado isso, entende? comenta sobre o padrasto ser tratado como um rei dentro de casa.
A passagem mencionada (Provérbios 21.1) é interpretada por alguns evangélicos como uma indicação de que Deus possui soberania, controle e influência sobre as decisões de líderes ou pessoas em posição de autoridade. Dentro dessa interpretação, o homem, seja ele pai ou padrasto, é visto como o governante da casa e da família.
Meu padrasto é um papa, não existe isso de alguém questioná-lo. É ele quem decide onde você vai trabalhar, com quem você vai se relacionar, em quem você vai votar. Sempre houve uma cultura de muito medo na minha casa. Quando ele chegava, eu me escondia. Era muito pesado, ele fazia terror psicológico o tempo inteiro Nathan Gouvêa.
O site UOL conversou, sob condição de anonimato, com outras cinco pessoas muito próximas do pastor, que frequentavam a casa da família e os bastidores da Igreja Bola de Neve. Elas caracterizaram Rinaldo como um homem “autoritário”, “poderoso”, “que não admite ser questionado”, um “homem dos nãos”.
Ele era muito duro comigo. Eu nunca podia ter acesso a nada, então, por exemplo, no armário tinham as coisas que eram só dele e tinha o resto que eu poderia comer. Era normal ele comer filé-mignon e eu comer carne moída. Nunca pude questioná-lo, ele sempre dizia: ‘A casa é minha, eu pago por isso’.
“Roxos estranhos no braço”
Até completar 12 anos, Nathan menciona não recordar agressões contra sua mãe, Denise. No entanto, após essa idade, ele começou a perceber uma escalada na violência e o aparecimento de “roxos estranhos” nos braços dela. Em 2022, Denise revelou pela primeira vez que sofria agressões físicas do marido.
Eu só via os abusos psicológicos. Eu não via o que estava debaixo do meu nariz. Éramos dois serviçais em casa, eu e minha mãe. Ele jamais se levantava do sofá para fazer qualquer coisa, começava a gritar quando queria algo e ficavam os dois apavorados. Agressão verbal e tratamento desmedido eram frequentes. Nunca vi ele agredindo [fisicamente] a minha mãe, mas via uns roxos meio estranhos no braço dela.
No início de 2023, quase um ano após Denise mencionar as agressões, ela expressou ao filho o desejo de se separar.
De acordo com Nathan, ela também compartilhou seus planos com outras pessoas da igreja, e a informação acabou chegando a Rinaldo. Foi então que o apóstolo começou a dizer a seu círculo mais próximo que Denise estava com problemas psicológicos e que talvez precisasse ser internada, relata Nathan.
Pra gente, era muito claro que ele ia interná-la. Foi por isso que publiquei um vídeo de uma discussão entre eles, para provar que a situação estava muito ruim. Lá, no vídeo, ele fala que ela está louca, que ele não queria mais ficar com ela.
O vídeo se tornou viral e, diante da repercussão, Denise realizou uma transmissão ao vivo para afirmar que estava bem. Apenas no início de junho deste ano, ela conseguiu a coragem necessária para solicitar a medida protetiva e deixar a residência. Atualmente, o caso é tratado sob sigilo judicial.
Em entrevista ao portal UOL, Rinaldo respondeu às declarações do enteado sobre seu relacionamento com Denise, afirmando:
Nathan saiu de casa há dez anos. Não tem a mínima ideia do que vivemos. Tudo o que eu sempre quis foi vê-la com saúde física, mental e emocional. Isso incluiu todo o cuidado com acompanhamento profissional, porém, em nenhuma hipótese, uma internação em clínica psiquiátrica. Essa foi só uma difamação para colocá-la contra mim.
Se ela não tem coragem de falar o que ele fez com ela, eu tenho coragem de falar o que ele fez comigo. Ele me agredia fisicamente e psicologicamente e já me deu um tapa que arrebentou o meu ouvido e fiquei um ano sem poder mergulhar afirma Nathan.
Desde que se afastou da Bola de Neve em 2019, Nathan relata que ainda lida com os traumas decorrentes do período em que viveu com sua mãe e padrasto, bem como do tempo em que atuou como líder e pastor de jovens na Bola de Neve, de 2007 a 2019.
Hoje, estou bem, mas tenho gatilhos do que fizeram comigo. Dizem que sou mimado, que tenho que apanhar, porque estou mentindo… É duro, me remete à infância e tudo o que passei. Não me permito chorar, de tanto que ouvi isso do meu padrasto e do entorno que o idolatrava. Estou batalhando para seguir a minha vida.
Denúncia não é caso isolado
Em 21 de junho, uma matéria revelou a denúncia de Paolla, que acusou Rinaldo de importunação sexual.
Paolla descreveu Rinaldo como seu “pai espiritual” e achou estranho quando ele começou a pedir que ela fizesse massagens.
Eu senti a mão dele fazendo massagem, a mão dele aqui perto dos meus seios, tocando na minha bunda. Eu sentia ele me manipulando e dizia para ele parar.
A advogada Jane Louise, representante de Paolla, afirma que sua cliente sofreu abuso religioso, moral e sexual.
Os processos correm em segredo de Justiça, mas, no caso dela, além de abuso moral e sexual, tem diversos direitos trabalhista não cumpridos.
A assessoria de Rinaldo, em resposta ao portal UOL, negou as acusações.
O apóstolo Rinaldo Seixas nega qualquer prática violenta e confia na apuração isenta e técnica de todos os fatos pela Polícia Civil e Ministério Público. O apóstolo se afastou voluntariamente da direção da Igreja Bola de Neve. Com muita serenidade, aguarda que sejam realizadas investigações imparciais e justas e tem convicção de que, ao final, será comprovada sua inocência.
Se você presenciar um episódio de violência contra crianças ou adolescentes, denuncie o quanto antes através do número 100, que está disponível todos os dias, em qualquer horário, seja através de ligação ou dos aplicativos WhatsApp e Telegram.
O mesmo número também atende denúncias sobre pessoas idosas, mulheres, pessoas com deficiência, pessoas em restrição de liberdade, comunidade LGBT e população em situação de rua. Além de denúncias de discriminação étnica ou racial e violência contra ciganos, quilombolas, indígenas e outras comunidades tradicionais.
Também é possível denunciar casos de maus-tratos e negligência a crianças e adolescentes nos Conselhos Tutelares, Polícias Civil e Militar e ao Ministério Público, bem como através dos números Disque 181, estadual; e Disque 156, municipal.