O relógio no telão conta os últimos três minutos antes do começo da apresentação. Cantores surgem executando danças ao som de luzes neon e uma banda ao vivo com guitarras vibrantes e batidas intensas de bateria. Embora pareça um concerto de música pop, é, na verdade, um culto religioso.
Durante aproximadamente trinta minutos, os jovens se entusiasmam com as músicas de louvor — conhecidas como worship na Lagoinha da Barra, localizada na Zona Oeste do Rio de Janeiro. A audiência canta junto versos como “Você tem meu sim/ Tem meu dom/ Meu futuro/ Te dou tudo” durante a performance.
Esta é a dinâmica dos cultos em igrejas pentecostais e neopentecostais, que desenvolvem estratégias para captar o interesse dos jovens.
Durante três semanas, a equipe do portal O GLOBO participou de cultos e entrevistou líderes de cinco dessas igrejas — Igreja Batista Lagoinha, Bola de Neve, Reino Church, United e Brasa Church.
Embora cada uma apresente características únicas, todas compartilham uma abordagem mais moderna em comparação com igrejas tradicionais, como a Assembleia de Deus.
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Croppeds e tênis tomam o lugar das mangas longas, saltos altos e ternos típicos de cultos mais conservadores. Após os eventos religiosos, há até espaço para um DJ tocar músicas eletrônicas.
Se vende um estilo de vida jovem, de oportunidades e pertencimento a um local descontraído, mas que te levará para o céu comenta o antropólogo Taylor de Aguiar, do Núcleo de Estudos da Religião da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
A abordagem teve sucesso com a empreendedora Jessica Farias, de 31 anos, que na infância frequentava a Assembleia de Deus e se distanciou ao concluir o ensino médio — porém, reencontrou a fé na Lagoinha.
Comecei a beber e a brigar com meus pais porque não queria ir ao culto. Passei anos sem entrar em uma igreja. Há dois anos, uma amiga começou a insistir que eu fosse na Lagoinha. Entrei e nunca mais saí.
Semelhante a um grande festival de rock, as atrações nessas congregações vão além da música. Os pastores anunciam brindes de marcas parceiras, que incluem desde procedimentos estéticos como o hydragloss, aplicado nos lábios para melhorar a hidratação, até sessões de fotos de “pré-wedding”, realizadas pelos noivos antes do casamento.
A combinação de inglês e português se estende tanto aos produtos disponibilizados quanto aos nomes de algumas dessas igrejas. Na Reino Church, fundada em 2021 em Balneário Camboriú (SC), a expressão “We are reino” (“nós somos reino”) é destacada na entrada. Dentro do templo, encontram-se outras frases, como “living the next extraordinary” (que pode ser traduzido como “vivendo de forma extraordinária”), um lema que reflete a filosofia da igreja.
Nomes de programas, estampas de camisa, outdoors: tudo se dialoga com a língua inglesa. Para circular pelo mundo, precisamos do inglês. Queremos membros preparados para andar pelo mundo anunciando a mensagem de Jesus explica o fundador Eduardo Reis.
A interação social se estende além dos cultos. Na Lagoinha, é comum realizar treinos funcionais na praia. No Lagoinha Coffee, visitantes são recepcionados com café e doces típicos como doce de leite e brigadeiro.
A Reino Church fomenta a prática de esportes como corrida e surfe, e até oferece suas próprias linhas de energéticos e picolés. Nos mais de 500 templos da Bola de Neve, uma prancha é parte constante da decoração do púlpito — um aceno ao uso inicial feito pelo apóstolo e surfista Rinaldo Seixas Pereira, conhecido como Rina, nos primeiros anos da igreja, no final dos anos 1990.
Visual da prosperidade
O uso do inglês, as tendências de moda, os brindes, os shows e a promoção de atividades físicas são estratégias usadas para discutir, fora dos sermões, um conceito importante para muitas igrejas evangélicas: a teologia da prosperidade, que relaciona fé e saúde física com prosperidade material.
É um jeito de falar sobre prosperidade e riqueza sem você incluir na hora da palavra. Esses aspectos semióticos, da demonstração do status da riqueza, marcas e músicas ajudam a passar essa mensagem diz o pesquisador Vinicius do Valle, do Observatório dos Evangélicos.
Apesar da ênfase nos elementos materiais da vida moderna, os líderes religiosos mantêm o foco no aspecto espiritual dos encontros. Isso foi evidente na apresentação de quinta-feira do pastor Lucas Gomes, na Lagoinha da Barra da Tijuca:
Não basta fazer oferta, trazer cantor, fazer evento, ter roupa bonita, fazer reels no Instagram se não tem o amor de Deus. Vai acabar do mesmo jeito. Estamos unindo aqui duas gerações, e Deus está vindo pela sua vida.
A atualização do visual não modificou a abordagem conservadora de temas como o sexo. A sexualidade continua sendo discutida dentro do contexto do casamento, e os valores tradicionais, como a importância da família, são preservados.
Se alguém que tenha pensamento sobre sexualidade diferente do que a palavra de Deus fala, com amor nós falamos o ponto da Bíblia e levamos as pessoas a tomarem suas decisões com Deus. Acolhemos todos, mas não vamos celebrar um casamento homoafetivo explica o pastor Maurício Soares, da Brasa Church.
A igreja organiza cultos que precedem shows em um teatro no Shopping Bourbon Country, em Porto Alegre, todos os domingos.