RuPaul ainda reina como a rainha das rainhas, porém, sua sucessora global já está estabelecida.
Ao longo dos últimos sete anos, Pabllo Vittar emergiu como uma das drag queens mais bem-sucedidas globalmente em vários aspectos. Seu portfólio inclui seis álbuns de estúdio, com um alcançando status de ouro, outro de platina, e dois de platina dupla.
Ela também lançou sua própria linha de moda em colaboração com a Adidas e protagonizou uma campanha publicitária mundial para a Calvin Klein, além de acumular 1,8 bilhão de streams em suas músicas.
Pabllo fez turnês nos Estados Unidos e Europa, apresentou-se em palcos renomados como o Lollapalooza e Coachella, tocou junto a Madonna no maior concerto da estrela pop, e performou nas Nações Unidas durante o aniversário da Rainha Elizabeth.
Pabllo Vittar considera RuPaul, de 63 anos, pioneiro entre as drag queens americanas, uma grande inspiração, apesar de nunca terem se encontrado pessoalmente.
RuPaul, por sua vez, descartou qualquer noção de rivalidade. No Twitter em 2022, ele escreveu: “EU AMO E APOIO @PablloVittar. Que vergonha para vocês, trolls maliciosos do Twitter, que tentam criar uma rivalidade.”
Contudo, segundo as métricas da internet atual, é inegável que Pabllo Vittar está começando a ultrapassar seu ídolo de infância. Com perfis no Facebook, Instagram, Twitter, TikTok e YouTube, Pabllo acumula um total de 36 milhões de seguidores, três vezes mais que RuPaul.
Ao longo desse caminho, Pabllo Vittar tornou-se um símbolo para a comunidade LGBTQ do Brasil.
O Brasil, conhecido por sua crescente cena de drag queens, também é pioneiro em direitos LGBTQ. Aqui, casais do mesmo sexo têm o direito de casar e adotar crianças, pessoas transexuais podem legalmente definir seu gênero, injúrias homofóbicas são criminalizadas e a controversa “terapia de conversão”, que tenta converter homossexuais em heterossexuais, é proibida.
Contudo, o Brasil ainda é um dos países mais perigosos para a comunidade gay e transexual. Desde 2008, mais de 1.840 transexuais foram assassinados no Brasil, um número mais que dobrado em comparação ao México, o segundo país mais letal segundo a Transgender Europe, um grupo de advocacia. O Brasil tem liderado essa triste estatística todos os anos desde que começou a ser monitorada.
Nunca sabemos quando será meu amigo, quando será minha família, quando será eu,
declarou Pabllo Vittar em uma entrevista.
Este é o maior objetivo da minha carreira: assegurar que os jovens não sintam esse medo ao sair de casa.
Pabllo Vittar tornou-se uma das mais influentes vozes da comunidade gay no Brasil, posicionando-se firmemente contra um movimento de direita, encabeçado por grupos cristãos conservadores, que promove uma visão heteronormativa de gênero, sexo e casamento como parte central de sua agenda política.
Durante as eleições de 2022, Pabllo Vittar foi uma crítica vocal de Bolsonaro, resultando em uma reclamação formal por parte da campanha do então presidente depois que ela pediu sua saída durante uma apresentação no Lollapalooza. Com a derrota de Bolsonaro para Luiz Inácio Lula da Silva, um candidato de esquerda, Pabllo Vittar destacou-se como a principal atração no show de posse de Lula.
Subir ao palco como uma drag queen já é, por si só, um ato político, afirmou Pabllo Vittar.
Eu demonstro para aquele filho e para aquela mãe lá no fundo que eles também podem estar aqui, para não terem medo, para não desistirem de quem são.
Pabllo Vittar tem sido uma fonte de inspiração poderosa para seus fãs gays e transexuais.
Ela nos dá uma sensação de segurança, compartilhou João Rabelo, publicitário de 28 anos, da cidade natal de Pabllo Vittar no norte do Brasil.
Agora posso caminhar tranquilamente na rua com meu namorado, sem medo.
Embora o público geralmente veja Pabllo Vittar vestida de mulher, fora dos palcos, ela vive como homem.
Gênero é uma construção social, explicou Rodrigues da Silva, o nome verdadeiro da estrela.
O que realmente importa é como nos sentimos por dentro. Me sinto um menino, e isso não muda quando Pabllo Vittar aparece.
Quanto ao uso de pronomes, ela é flexível, especialmente quando não está performando.
“Se estou de drag, por favor, usem o feminino”, ela pediu.
De certa forma, o estilo de vida de Pabllo Vittar dividiu sua existência em duas personalidades distintas: Phabullo, o homem, e Pabllo, a drag queen.
Phabullo é reservado, morando com sua mãe, padrasto e irmã em uma casa de luxo numa pequena cidade comparável ao Centro-Oeste do Brasil. Como Pabllo, ela reside em um modesto apartamento em São Paulo, a maior metrópole da América Latina.
Phabullo é introvertido e reluta em assumir responsabilidades. Já Pabllo é o extremo oposto.
Se a loira estivesse aqui, ela estaria flertando com você, revelou ele em uma entrevista, falando de seu alter ego enquanto não estava montado.
“Ela é ousada e provocante. Eu não sou.”
Ele fala de sua persona drag na terceira pessoa.
Porque ela é realmente uma entidade à parte, explicou.
Quando algo que Pabllo faz repercute em minha vida pessoal, onde sou tímido, detesto isso. Dá vontade de me esconder em um buraco.
Rodrigues da Silva nasceu no Maranhão, o estado mais pobre do Brasil, filho de uma mãe solteira que trabalhava como técnica de enfermagem. Desde os cinco anos, já se sentia atraído pelos palcos, começando pelo coral da igreja.
Eu só queria cantar, contou, e queria ser visto enquanto cantava.
Ele relatou que era frequentemente ridicularizado por seus colegas devido ao seu comportamento afeminado, mas sempre contou com o apoio de sua mãe. Durante sua adolescência, ele cantava no YouTube e em bares locais. Em uma festa de Halloween num clube gay, no dia de seu aniversário de 18 anos, ele decidiu se montar pela primeira vez.
Nunca tinha sentido uma liberdade tão intensa – foi uma oportunidade de expressar tudo o que estava em minha mente, ele compartilhou.
Na mesma época, um vídeo dele cantando uma música de Whitney Houston começou a viralizar. Yan Hayashi, o proprietário do clube, e Rodrigo Gorky, um produtor musical, perceberam seu potencial e começaram a gerenciar Rodrigues da Silva sob o nome de Pabllo Vittar, uma homenagem a uma drag queen que ele havia conhecido anteriormente.
Pabllo Vittar rapidamente ganhou espaço na mídia, liderando uma banda num programa de variedades noturno. Logo em seguida, começou a lançar suas próprias músicas e, em 2017, alcançou o topo das paradas no Brasil.
Desde então, Pabllo Vittar se estabeleceu como uma das principais atrações musicais do Brasil, conhecida por sua voz potente, coreografias elaboradas e performances energéticas. Ela também conquistou uma base de fãs internacionais, principalmente na comunidade LGBTQ, e atualmente trabalha em um álbum que combina inglês e espanhol.
Owen Mallon, de Chicago, é um dos três empresários de Pabllo Vittar e enfrenta o desafio de transformar uma drag queen que fala português em uma estrela internacional rentável. No entanto, ele tem se mostrado consistentemente impressionado com a receptividade do público.
Mesmo que as pessoas não entendam o idioma, elas adoram o que ela representa, e isso faz com que a performance se destaque por si só, comentou ele.
A música de Pabllo abrange desde pop e eletrônico até ritmos brasileiros. Seu último álbum explora sons populares do norte e nordeste do Brasil, sua região natal, incluindo forró, com seu característico acordeão, e tecnobrega, com seus marcantes sintetizadores.
Depois de uma entrevista como Sr. Rodrigues da Silva, ela se transformou em Pabllo Vittar horas depois para um show beneficente no Maranhão. Essa metamorfose geralmente dura três horas. (Tal como um atleta coleciona tênis, ela acumulou uma coleção de 200 perucas, doadas por um fabricante de Londres.)
No palco, ela vestia um top que replicava a bandeira do estado, uma peruca loira, botas brancas, uma minissaia e fio dental. Enquanto aguardava para se apresentar sob o calor do Brasil, seu cabeleireiro usou um ventilador para refrescá-la.
Este é o meu lugar favorito no mundo, declarou ela. Assim que subiu ao palco, a multidão foi ao delírio.