Um dos nomes mais reverenciados da literatura brasileira é Vinicius de Moraes, o poeta, escritor, letrista, músico, diplomata, dramaturgo e crítico de cinema brasileiro.
Nascido em 1913, no Rio de Janeiro, Vinicius de Moraes se tornou um ícone literário cujo legado continua cativando a história de várias gerações no Brasil. Seus poemas tinham uma intensidade emocional única, voltado sempre para o amor, porém suas obras também se aventuraram por outros assuntos importantes, como os problemas sociais e políticos do mundo.
Nascido de uma família de tradições culturais e literárias, Vinicius de Moraes tinha paixão pela escrita desde cedo, influenciado pelo ambiente intelectual que vivia. Ele se formou em Direito, porém, foi através dos seus versos e estrofes que encontrou a verdadeira vocação. Então, iniciou sua carreira ao lançar “O Caminho para a Distância”, um livro encantador de sonetos.
Além disso, Vinicius de Moraes teve grande contribuição à música brasileira, participando junto de Tom Jobim e João Gilberto na construção da Bossa Nova, um movimento que revolucionou a história da música no Brasil. Músicas como “Garota de Ipanema” e “Chega de Saudade” se tornaram verdadeiros hinos no país, repleto de emoção e poesia.
De modo geral, este poeta frequentemente retratava a mulher como uma figura celestial, cheia de poder e graça. Pensando na importância de Vinicius de Morais à literatura brasileira, neste artigo iremos explorar alguns dos seus melhores poemas, analisando os seus significados. Confira abaixo!
- Biografias: Biografia de Bruno de Luca
15 melhores poemas de Vinicius de Moraes
1.Ternura
“Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma…
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar extático da aurora”.
Este poema de 1938, trata como tema as consequências provocadas pelo amor, no qual o poeta traduz aquilo que o apaixonado sente, tão idealizado em seu coração, além das desculpas que pede por esse sentimento tão repentino e forte. Ele tenta controlar os seus sentimentos, no entanto, se coloca inteiramente à disposição desse amor, visto como algo que traz sossego para ele. Dominado pelo que sente, ele se declara falando sobre o carinho que nutre por ela, prometendo-lhe dedicação absoluta.
2. A você, com amor
“O amor é o murmúrio da terra
quando as estrelas se apagam
e os ventos da aurora vagam
no nascimento do dia…
O ridente abandono,
a rútila alegria
dos lábios, da fonte
e da onda que arremete
do mar…
O amor é a memória
que o tempo não mata,
a canção bem-amada
feliz e absurda…
E a música inaudível…
O silêncio que treme
e parece ocupar
o coração que freme
quando a melodia
do canto de um pássaro
parece ficar…
O amor é Deus em plenitude
a infinita medida
das dádivas que vêm
com o sol e com a chuva
seja na montanha
seja na planura
a chuva que corre
e o tesouro armazenado
no fim do arco-íris.”
Através do seu olhar poético, Vinicius de Morais tenta definir o que é o amor, recorrendo a comparações e definições subjetivas para tal, como o “silêncio que treme”. A partir de metáforas, ele vai tentando nomear esse sentimento tão complexo e difícil de explicar, deixando claro que tudo foi escrito especialmente para a mulher amada.
3. Soneto de fidelidade
“De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.”
Consagrado por esse famoso poema, Vinicius de Moraes usa uma forma clássica de soneto, em quatro estrofes, para falar sobre a lealdade que corre nas veias do locutor, sua vontade de cuidar e amar, mostrando que o amor vence todas as barreiras da vida. Composto em homenagem a sua primeira mulher, o poeta recorda desse sentimento, deixando claro que o amor não é imortal como muitos românticos acreditam, por isso, é preciso aproveitar enquanto as coisas duram.
4. Eu sei que vou te amar
“Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida eu vou te amar
Em cada despedida eu vou te amar
Desesperadamente
Eu sei que vou te amar
E cada verso meu será pra te dizer
Que eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida
Eu sei que vou chorar
A cada ausência tua eu vou chorar,
Mas cada volta tua há de apagar
O que essa ausência tua me causou
Eu sei que vou sofrer
A eterna desventura de viver a espera
De viver ao lado teu
Por toda a minha vida.”
Musicalizado posteriormente por Tom Jobim, esses versos se tornaram uma linda canção, no qual o poeta se declara e afirma que até o fim de sua vida será completamente entregue e apaixonado pela sua amada. Ele mostra que o afeto que tem por ela é tão forte que irá sofrer a cada momento em que ela se ausentar, mas que mesmo assim, seu coração pertencerá a ela. Completamente apaixonado, o locutor mostra ser dependente da amada, devoto a ela até o fim.
5. Soneto do amor total
“Amo-te tanto, meu amor… não cante
O humano coração com mais verdade…
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade
Amo-te afim, de um calmo amor prestante,
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.
Amo-te como um bicho, simplesmente,
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.
E de te amar assim muito e amiúde,
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.”
Neste poema de 1951, um dos mais belos da poesia brasileira, o locutor mostra toda a complexidade do sentimento que nutre pela amada em apenas 14 versos. Ao mesmo tempo que fala sobre um amor amigo e amante, ele tenta traduzir em palavras todo o seu carinho. Esse amor é retratado de diversas maneiras, como algo sereno, pautado na amizade, até chegar a um sentimento animalesco e de urgência, incontrolável. Ao final, o sujeito conclui que ama tanto que, de certa forma, teme morrer afogado em tanto amor.
6. Soneto do Amigo
“Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.
É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.
Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.
O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica…”
Criado em 1946, durante o exílio em Los Angeles, Vinicius de Moraes foge um pouco do seu padrão ao tratar um tema diferente, sobre uma amizade duradoura e capaz de vencer a qualquer tempo e distância. O locutor demonstra que, mesmo a amizade não sendo mais algo presente no cotidiano, o amor, o afeto e a confiança continuam o mesmo. Sem saber explicar, ele apenas sabe que um velho e bom amigo sempre é uma redescoberta, suscitando dentro de si a confiança e a relação que sempre tiveram.
7. A felicidade
“Tristeza não tem fim
Felicidade sim…
A felicidade é como a pluma
Que o vento vai levando pelo ar
Voa tão leve
Mas tem a vida breve
Precisa que haja vento sem parar.
A felicidade do pobre parece
A grande ilusão do carnaval
A gente trabalha o ano inteiro
Por um momento de sonho
Pra fazer a fantasia
De rei, ou de pirata, ou da jardineira
E tudo se acabar na quarta-feira.
Tristeza não tem fim
Felicidade sim…
A felicidade é como a gota
De orvalho numa pétala de flor
Brilha tranquila
Depois de leve oscila
E cai como uma lágrima de amor.
A felicidade é um coisa louca
Mas tão delicada, também
Tem flores e amores de todas as cores
Tem ninhos de passarinhos
Tudo isso ela tem
E é por ela ser assim tão delicada
Que eu trato sempre dela muito bem.
Tristeza não tem fim
Felicidade sim…”
Este outro lindo poema de Vinícius de Moraes fala sobre o desejo instintivo do ser humano em alcançar a felicidade plena. Nos versos, ele mostra oposições entre a felicidade e a tristeza, comparando momentos reais e cotidianos, como um simples Carnaval, que sempre tem hora para acabar. Como não é possível nomear a felicidade, o locutor apresenta as possibilidades presentes nos simples detalhes da vida.
8. A rosa de Hiroshima
“Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroxima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida.
A rosa com cirrose
A antirrosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada.”
Como já dito aqui, Vinicius de Moraes ficou muito conhecido pela sua lírica amorosa, no entanto, ele também fez versos sobre outros temas, como a rosa de Hiroshima. Preocupado com o futuro e com as escolhas da sociedade, o diplomata escreveu em 1973 essa crítica à Segunda Guerra Mundial, especialmente as explosões das bombas atômicas nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão. Posteriormente musicado por Gerson Conrad, o poema trata é um pedido de socorro, para que os governantes possam olhar para o seu povo antes de fazer algo tão catastrófico.
9. Soneto de contrição
“Eu te amo, Maria, eu te amo tanto
Que o meu peito me dói como em doença
E quanto mais me seja a dor intensa
Mais cresce na minha alma teu encanto.
Como a criança que vagueia o canto
Ante o mistério da amplidão suspensa
Meu coração é um vago de acalanto
Berçando versos de saudade imensa.
Não é maior o coração que a alma
Nem melhor a presença que a saudade
Só te amar é divino, e sentir calma…
E é uma calma tão feita de humildade
Que tão mais te soubesse pertencida
Menos seria eterno em tua vida.”
Um dos poucos poemas que se dirige a alguém especificamente, o locutor também fala um pouco mais sobre a jovem por quem tanto nutre um amor sem medida. Nos versos, ele chega a comparar o amor como a dor de uma doença, tentando dimensionar esse sentimento e transmitir o que sente a ela. Esse soneto, porém, muda de forma ao final, traduzindo o sentimento à Maria como algo divino e tranquilo.
10. Tomara
“Tomara
Que você volte depressa
Que você não se despeça
Nunca mais do meu carinho
E chore, se arrependa
E pense muito
Que é melhor se sofrer junto
Que viver feliz sozinho
Tomara
Que a tristeza te convença
Que a saudade não compensa
E que a ausência não dá paz
E o verdadeiro amor de quem se ama
Tece a mesma antiga trama
Que não se desfaz
E a coisa mais divina
Que há no mundo
É viver cada segundo
Como nunca mais.”
Outro poema transformado em uma das canções mais consagradas do MPB é este, onde o eu-lírico se vê abandonado pela amada, torcendo para que ela volte e nunca mais se despeça. Sem optar pela raiva ou pela vingança, ele deseja que ela volte para ele e nunca mais tente partir de novo, pois é melhor estar a dois, ainda que com algum sofrimento, do que seguir sozinhos. Assim, o locutor torce para que ela reconheça sua falta, que volte para onde estava e possa viver junto dele como nunca antes.
11. A uma mulher
“Quando a madrugada entrou eu estendi o meu peito nu sobre o teu peito
Estavas trêmula e teu rosto pálido e tuas mãos frias
E a angústia do regresso morava já nos teus olhos.
Tive piedade do teu destino que era morrer no meu destino
Quis afastar por um segundo de ti o fardo da carne
Quis beijar-te num vago carinho agradecido.
Mas quando meus lábios tocaram teus lábios
Eu compreendi que a morte já estava no teu corpo
E que era preciso fugir para não perder o único instante
Em que foste realmente a ausência de sofrimento
Em que realmente foste a serenidade.”
Escrito no Rio de Janeiro, em 1933, Vinicius de Moraes conta a trágica história de um casal apaixonado que sofre com a separação. Cheio de sensibilidade, ao longo dos onze versos entendemos que apesar de se amarem, agora, eles tiveram que se separar definitivamente. Tentando vencer o medo que era perder sua amada, ele tenta se aproximar, mas suas investidas são em vão, carregado de dor e sofrimento.
12. Poema de Natal
“Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos…
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.”
Como uma verdadeira reflexão do passado e tudo aquilo que realmente importa, o eu-lírico faz um balanço do que aconteceu, olhando suas lembranças como se agora pudesse ver de fato o valor que a vida tem. Por fim, ele chega a conclusão de que o destino a partir dali era de esperança e leveza.
13. Poema dos olhos da amada
“Ó minha amada
Que olhos os teus
São cais noturnos
Cheios de adeus
São docas mansas
Trilhando luzes
Que brilham longe
Longe nos breus…
Ó minha amada
Que olhos os teus
Quanto mistério
Nos olhos teus
Quantos saveiros
Quantos navios
Quantos naufrágios
Nos olhos teus…
Ó minha amada
Que olhos os teus
Se Deus houvera
Fizera-os Deus
Pois não os fizera
Quem não soubera
Que há muitas eras
Nos olhos teus.
Ah, minha amada
De olhos ateus
Cria a esperança
Nos olhos meus
De verem um dia
O olhar mendigo
Da poesia
Nos olhos teus.”
Nestes versos, o eu-lírico relaciona sua amada ao universo da navegação, como navios, cais e naufrágios, enaltecendo a mulher através de um olhar único. Para ele, os olhos da própria amada, inclusive, são objeto de sua adoração, afirmando que se Deus existir, ele teria sido o autor dessa linda criação. Completamente apaixonado, o locutor descreve o próprio olhar, como oposição aos dela, como se fosse um olhar de mendigo, já que os dela são tão belos.
14. Pela luz dos olhos teus
“Quando a luz dos olhos meus
E a luz dos olhos teus
Resolvem se encontrar
Ai que bom que isso é meu Deus
Que frio que me dá o encontro desse olhar
Mas se a luz dos olhos teus
Resiste aos olhos meus só p’ra me provocar
Meu amor, juro por Deus me sinto incendiar
Meu amor, juro por Deus
Que a luz dos olhos meus já não pode esperar
Quero a luz dos olhos meus
Na luz dos olhos teus sem mais lará-lará
Pela luz dos olhos teus
Eu acho meu amor que só se pode achar
Que a luz dos olhos meus precisa se casar.”
Esse é outro poema muito apaixonado de Vinicius de Moraes, que trata do olhar da amada e do eu-lírico, que estão conectados. A união dos dois transmite plenitude e contentamento, já que os versos demonstram uma série de afetos distintos ao cruzarem apenas um olhar. Ao mesmo tempo que a tranquilidade vem, a euforia e a sedução também estão presentes, tanto que o poema se tornou música para Tom Jobim.
15. Soneto de separação
“De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.”
O soneto de separação fala sobre momentos trágicos que todo mundo passa na vida, o final de uma relação amorosa. Sem saber dessa despedida brutal, o locutor demonstra a agonia que é sentir o vazio da partida de sua amada. Construído em pares opostos, ele tenta demonstrar seus sentimentos, como se tudo pudesse mudar em apenas um segundo.
Afinal, o que podemos concluir?
Ao percorrermos pelos versos de Vinicius de Moraes, podemos perceber sua inegável profundidade com a conexão humana. Sua poesia, que já atravessa o tempo e as fronteiras, é um legado bonito e forte para a literatura brasileira, impregnado de emoção e humanidade, nos guiando pelas complexidades da vida e do amor.
Se interessou por este conteúdo? Veja também: Descubra os 15 melhores poemas de Manoel de Barros