Com tantos ruídos no pensamento e sentimentos entrecortados dos tempos atuais, é comum que nos sintamos confusos e conflituosos conosco mesmo. A alma parece se encolher e o raciocínio estagna, não conseguindo mais ver a sua volta soluções para determinados problemas.
As madrugadas são de intensa desarmonia de ideias por conta da inquietação de acusações e cobranças que fazemos a nós mesmos, as horas passam e se demonstram impiedosas perante a insistente visita da insônia; o dia amanhece e o conflito interior só se acentuou.
Há muita gente falando, opinando, oferecendo, ensinando, magoando, descartando, ligando, indo e vindo e nos sentimos em meio a uma grande praça pública, onde os passos ritmados de quem passa, nos tonteiam, e então perdemos o fôlego, a respiração quer parar, o coração palpita mais forte, a garganta saboreia o amargor da secura e os olhos paralisam no vazio.
Eis que o mundo provavelmente está te afligindo nesse momento em que você se encontra sem forças para continuar e sem a compreensão necessária que lhe ajudaria a ir adiante.
Léu das situações, aos volteios que se seguem. Inundaram teu jardim com dor e perdição e você não percebeu, porque estava atarefado com o ganhar do pão, com o bem estar da família, com a satisfação do chefe, com o problema da amiga ou dívida do amigo, com o quê vestir para aquela festinha do fim de semana, com a solução rápida de emagrecimento, com o próximo capítulo da novela, quem casou ou descasou, qual é a última fofoca que está circulando, com o número de curtidas do facebook e instagram, e com isso e tantas outras coisas que tem regido inutilmente nossas vidas. Sim! Nós permitimos todas essas coisas e outras mais, todos os dias!
Com isso, quero fazer uma breve analogia com um trecho do conto Amor de Clarice Lispector:
- Comportamento: “Fui criticada por não ceder meu lugar no ônibus para uma grávida”, desabafa mulher em post polêmico
“(…) A rede perdera o sentido e estar num bonde era um fio partido; não sabia o que fazer com as compras no colo. E como uma estranha música, o mundo recomeçava ao redor. O mal estava feito. Por quê? Teria esquecido de que havia cegos? A piedade a sufocava, Ana respirava pesadamente. Mesmo as coisas que existiam antes do acontecimento estavam agora de sobreaviso, tinham um ar mais hostil, perecível… O mundo se tornara de novo um mal-estar.’’
Com o despertar da consciência, surgem os enjoos, o desinteresse e até mesmo um certo desespero de que tudo vai perdendo graça e, consequentemente, você somente segue o fluxo. Lhe digo então, caro leitor: Não! Não siga o fluxo! Não seja robótico! Não reaja no automático. Recua, desacelere, desligue-se, desconecte-se, silencie-se, se recolha do mundo e tenha um panorama de fora do círculo. Dar meia-volta na vida não é fraqueza e nem mesmo estupidez, essa atitude denota que tens força para recomeçar de maneira mais cautelosa e sábia. Eu também sou como você, que pôde ou não ter se identificado com esse texto; e num dia em que conflitos aparecem e nos encurralam, pude escrever uma poesia com esse trecho: “De recomeços, as cinzas se recolhem e moldam nova criatura.” (Charlene Santos).
Ouça em seu recolhimento o que suas aflições querem lhe dizer e ensinar, se atente ao que sua alma quer te mostrar para que seu retorno ao mundo não seja em vão. Não sejas abrigo do descontentamento. Seja equilíbrio para você e para os que lhe cercam. Ressurja das cinzas sempre que necessário.
Charlene Santos