O folhetim que tomou o lugar de “Pantanal” não tem agradado tanto ao público, e Glória Perez precisou fazer drásticas mudanças na história para tentar que espectadores assistam.
Quando o assunto é novela, boa parte da população brasileira tem uma opinião formada sobre as tramas, atuações e conseguem elencar rapidamente uma lista das melhores produções do país. Desde “Pantanal”, que registrou recordes de audiência na Rede Globo, a emissora já não tem mais visto tanta fidelidade do público.
No horário nobre, o folhetim que ocupou o lugar da produção de Bruno Luperi foi “Travessia”, escrita por Glória Perez. Tinha tudo para dar certo, a autora recentemente esteve sob os holofotes ao relembrar o assassinato da filha Daniella Perez, há cerca de 30 anos, em uma minissérie produzida pela HBO. Mas não foi assim que aconteceu, a novela tem registrado cada vez menos pontos de audiência, e as polêmicas por trás dos bastidores têm forçado a trazer reviravoltas para o roteiro.
Nas redes sociais, os internautas inundam as plataformas com críticas à trama, que vão desde a atuação de alguns atores, a pedidos de retirada de alguns personagens, como o caso de Cidália, interpretada por Cássia Kis. Segundo reportagem do jornal Metrópoles, desde o dia 31 de outubro, a produção está passando por múltiplas alterações no roteiro, em busca de captar mais telespectadores e conseguir que o público se mantenha fiel à história.
A tentativa é que a audiência aumente o mais rápido possível, já que no dia 4 de novembro, “Travessia” registrou apenas 23.6 pontos, um número que não agrada nem um pouco a Globo. De acordo com o site Metrópoles, as reviravoltas na trama estavam previstas apenas a partir do 50º episódio, mas precisaram ser antecipadas com menos de um mês da novela no ar.
O reencontro de Brisa (Lucy Alves) e Ari (Chay Suede) acabou sendo adiantado, e Glória Perez vai passar a manter mais a trama envolta no núcleo principal, fazendo com que a maranhense apareça como uma heroína sofredora, mas que nunca se rende ou abaixa a cabeça para as dificuldades da vida e imposições. Uma das outras tentativas, já anunciada pela autora, é a abordagem dos impactos das fake news na vida de pessoas comuns.
- Novelas: Fãs de “Renascer” celebram a participação de Irandhir Santos na novela: “Artista de verdade”
Logo no início da novela, Brisa acaba sendo vítima de uma deep fake, com uma montagem que a faz ser confundida com uma sequestradora de crianças. A história foi baseada no caso de Fabiane Maria de Jesus, uma dona de casa que sofreu linchamento em Guarujá, no litoral paulista, em 2014.
Novela se inspira em fake news real
Fabiane Maria de Jesus foi torturada e assassinada por uma multidão depois de ser confundida com uma sequestradora de bebês, fazendo com que a família ainda precise lidar com o drama e o luto do caso. A dona de casa tinha saído de casa de bicicleta para buscar a bíblia que tinha esquecido na igreja que frequentava, e depois ia para a casa de um familiar. No meio do caminho, ela acabou sendo abordada por pessoas que a confundiram com uma suposta criminosa, que fazia rituais de magia com as crianças que sequestrava.
Os boatos sobre o caso tinham surgido no Facebook uma semana antes, falando sobre uma mulher que estaria sequestrando bebês, mas as informações se referiam a um crime cometido cerca de dois anos antes, na Zona Norte do Rio de Janeiro, e não em São Paulo, como os internautas estavam compartilhando.
Fabiane acabou sendo confundida a partir de um retrato falado que uma página do Guarujá compartilhou, mas não existia nenhuma denúncia sobre sequestradoras de crianças ou bebês na cidade. Ela tinha apenas 33 anos, e na ocasião os envolvidos e as testemunhas do caso acabaram registrando vídeos das torturas e do linchamento que a dona de casa sofreu, imagens que foram essenciais para que a Polícia Civil encontrasse os principais suspeitos do crime.
Após o linchamento, Fabiane foi arrastada até uma passarela da cidade e encontrada por policiais militares em estado grave. A vítima foi socorrida, mas morreu dois dias depois no hospital, causando uma forte comoção nacional e levantando a questão sobre o que fazer com os cidadãos que estavam envolvidos nas agressões.
A Polícia Civil constatou, a partir das filmagens, que cinco homens participaram do linchamento diretamente, sendo condenados a 30 anos de prisão, pena máxima no Brasil, além de pagar uma indenização à família de R$ 550 mil. De acordo com informações da Folha de S. Paulo, o juiz classificou o crime como uma “barbárie atípica”, e ainda afirmou que o condenado tinha “afinidade com a monstruosidade”.
Além dos homens, duas mulheres, Daiana e Camila, foram indiciadas por incitação ao crime, já que foram elas que acusaram Fabiane injustamente na ocasião. Por mais que os envolvidos tenham sofrido punições judiciais, as pessoas responsáveis por espalhar as notícias falsas não foram responsabilizadas pelo que ocorreu. A repercussão do caso fez com que um projeto de lei fosse criado para incluir a divulgação de fake news no Código Penal.