Sabe aquela sensação de assistir a um filme esperando um final surpreendente e ficar totalmente frustrado quando a tela escurece, aparecem os créditos e não acreditamos que o desfecho foi aquele? Pois é, aguardávamos por mais. Preferíamos que a história terminasse como imaginamos.
E, geralmente, esse final é o mais feliz possível. Acredito que seja por isso que não gosto de trilogias, tanto literárias quanto em filmes.
Só um pouquinho, como assim, terei que esperar sabe-se lá quanto tempo para descobrir o que aconteceu com aquelas personagens? Não, não é certo isso. Muito mais que curiosidade, me entreguei ao enredo durante algum tempo, me envolvi em suas tramas. Então, nada mais justo que a história não termine assim, pela metade, em doses homeopáticas, sem acabar de verdade.
E assim é a vida real. Cheia de gigantescos e complexos pontos finais e de “The End” mal anunciados, não previstos, não desejados, nada bem-vindos. E o que é bem pior. A vida é feita de histórias verdadeiras, nada fictícias, somos nós os personagens de nossas biografias. Rabiscadas, rasuradas, rascunhadas, inacabadas. Muitas vezes não autorizadas. E nessas páginas e páginas, nessas horas e horas de um longa metragem, cabe a nós escrever o final do conto. E é aí onde quero chegar.
Quantas vezes encerramos ciclos sem desejarmos isso verdadeiramente? Quantas vezes investimos em algo, nos entregamos de cabeça e coração, apostamos que daria certo e simplesmente assim, de uma hora pra outra, vem a vida e o destino, como se fossem aqueles editores e produtores arrogantes, gritando com ou sem claquete, com ou sem explicação: “Corta, essa cena/capítulo não serve, vamos começar do zero”.
Não tem argumento que os convença do contrário. Cabe a nós aceitar o fim. E, o que é pior, ao relermos o capítulo ou assistirmos com mais critério aquela cena, temos que concordar com o senhor destino e senhora vida. Realmente, o que achávamos maravilhoso, o que considerávamos o ponto máximo de nossa história, não passou de passado, não vende, não dá audiência e nem nos sustenta por semanas e semanas na “lista dos mais lidos”. É bom, incrível,mas impossível. E se assim o é, antes fosse ruim, sem graça, realista. Seria mais fácil a aceitação.
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Claro que não chegamos a esta constatação de um dia pro outro, de uma hora pra outra. Precisamos de maturidade. Quem sabe de terapia. Necessitamos compreender que temos o nosso próprio tempo. O poeta, Cazuza, sopra constantemente em meu ouvido que “o tempo não pára”. E ele tem plena razão.
Uma senhora um dia contou a um menino que, na vida, se algo não tem remédio, remediado está. Ele acreditou e sempre lembrou estas palavras quando se encontrava naquelas sinucas de bico que o destino prega. Um senhor, por sua vez, falou durante muitos anos para uma menina que na vida, colhemos o que plantamos. Ela, hoje crescida, contesta um pouco essa afirmação. Conversa com ele mentalmente argumentando: “Como assim, plantei amor e não foi isso que eu colhi. Dei o meu melhor, como se fosse flor e entregasse minhas lindas pétalas perfumadas e amarelas. Porém, espetei-me tantas vezes em espinhos”. E ele, de onde está, responde como uma brisa para aquela garota crescida: “Tem coisas que não entendemos num primeiro momento, mas, com o tempo, tudo se torna mais claro, mais nítido. Revela seus verdadeiros sentidos, tantas vezes mais subentendidos que gostaríamos. Calma minha garotinha balzaquiana, as abóboras se assentam com o andar da carruagem”.
E vem e volta, voltamos a questão do tempo. Aquele, que nos pede calma. Aquele, que nos tira a calma. É sobre o tempo o maior número de frases prontas que conheço. Diz a lenda que ele cura tudo. Que ele ameniza dores. Que transforma feridas abertas em imperceptíveis cicatrizes. Confesso que ando meio brigada com esse tal de tempo. Estou tentando há horas entendê-lo. Mas é ele a figura metafórica mais complexa com a qual me deparei. Quando penso que o estou decifrando, lá vem ele, transformando ponto final em ponto e vírgula. Transformando certezas em dúvidas, e vice-versa, sucessivamente.
E assim, por mais que não gostemos de trilogias, quem sabe, e só quem sabe, seja sim necessário que aguardaremos o próximo capítulo, a próxima cena, para que a nossa história tenha seu desfecho.
Tenho uma extrema vontade de perguntar a ele se está “tirando meu tempo”, mas ele não me entenderia. Pensaria que além de confusa, estou sendo redundante, me apoderando de uma analogia de quinta categoria. Não me atrevo a pensar que ganharia essa briga. Com ele, ninguém pode. A certeza de ser a parte mais fraca, de saber que o tempo sempre estará a nossa frente ou nos prendendo ao passado, nos tira o chão. É como se perdêssemos algo importante, valoroso. É como entregar o bico ao Papai Noel ou ao Coelhinho da Páscoa em troca de um presente. Estamos ganhando algo, mas o que perdemos gostávamos tanto, era tão especial para nós.
Fernando Teixeira de Andrade disse que: “Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”.
Ou seja, muito mais importante do que o tempo que as coisas levam para acontecer e do tempo que levamos para compreendê-las, é o resultado que as mudanças provocam em nós. E assim, por mais que não gostemos de trilogias, quem sabe, e só quem sabe, seja sim necessário que aguardaremos o próximo capítulo, a próxima cena, para que a nossa história tenha seu desfecho.