O perdão a si mesmo vai acontecer, mas é preciso, como tudo nessa vida, que a gente se permita.
Perdoar a si mesmo não é fácil. Perdoo com certa facilidade as outras pessoas. É fácil, se comparado ao esforço que tenho de fazer para fazer o mesmo por mim.
Os outros machucam, magoam, ultrapassam os limites e invadem a minha privacidade. Invadem e quebram as barreiras que me protegem. Mas para os outros, embora venham a dor e a mágoa, parece-me mais fácil. Deixar de falar, bloquear o número de telefone, mudar de casa, de rua e de país. Mudar de emprego, dizer algumas coisas. De repente, perdoar e deixar que vá. Para bem longe, em muitas das vezes.
Mas… quando trato de mim mesma, não posso fazer o mesmo.
As coisas vulgares e materiais da vida, no fundo, não deixam saudade. Saudade mesmo que aperta e que dói é a saudade da gente mesmo e de todas as lembranças que carregamos. São essas emoções que ficam difíceis de separar dos acontecimentos e que tornam mais difícil perdoar a nós mesmos pelo que passou ou pelo que não passou.
Antes de perdoar alguém, pergunte a si mesmo se está disposto a desistir das coisas que o fizeram mal e que não o deixam dormir porque não consegues perdoar a si próprio.
Ainda estou a caminhar nesse sentido. Afinal, é um processo e não há tempo definido para terminar ou começar. Mas tem de ter início eventualmente.
Não existe cedo ou tarde. Nem tempo certo ou errado. As coisas acontecem quando devem acontecer. O perdão a si mesmo vai acontecer, mas é preciso, como tudo nessa vida, que a gente se permita.
Ainda permito magoar a mim e não me olhar nos olhos ao espelho porque infligir dor é mais fácil. Aconchegar ao colo a nós mesmos exige aceitação do que somos, de nossas limitações e falhas. Não estamos dispostos a reconhecer verdadeiramente as nossas limitações.
Reconhecer que podemos errar e falhar é reconhecer a humanidade que temos dentro de nós. Essa humanidade que abafamos porque buscamos ser deuses perfeitos e atemporais.
Esta não é a nossa natureza. Como humanos que somos, na nossa suposta imperfeição, somos o que há de mais perfeito. Logo, acarinhe essa humanidade que tem dentro de si. Eu me aconchego em mim mesma e procuro entender essa humanidade que existe dentro de mim para que eu possa ajudá-la a crescer e a se desenvolver o melhor possível, para dar espaço para que eu esteja bem comigo mesma, com minhas vitórias e aprendizados.
Eu aceito e recebo o perdão que eu não soube me dar quando eu mais precisei para levantar, para olhar à frente de cabeça erguida onde só eu podia fazer alguma coisa por mim mesma.
Os outros nos ajudam e é preciso que estejamos abertos a isso. Mas o maior trabalho é feito por nós mesmos. Nossa maior expectativa está em nós mesmos.
Perdoo a mim mesma, como se fosse mais importante do que respirar. Ao entrar profundamente para dentro de mim, ao me perdoar de alma leve e liberta, posso garantir o meu processo de cura.
A cura, em sua essência, é de dentro pra fora. Embora possamos ser agentes de cura, apenas somos facilitadores para o outro. O trabalho é interno, portanto, quando se trata de nós mesmos, somos o papel principal e o coadjuvante, ao mesmo tempo e, assim, somos capazes de abrir essa oportunidade de efetivamente sermos curados.
A disposição para o perdão é um dos maiores exercícios que podemos enfrentar e correr o risco de concretizar. Vale a pena. Saímos diferentes e mais leves quando aprendemos a perdoar.
Ao perdoar, ajudamos a curar o outro. Quando conseguimos fazer isso com a gente mesmo, então, entramos num novo nível. Espetacular!
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