”Por que a voz das mulheres ainda incomoda tanto? Por que ainda precisamos ser amordaçadas simbolicamente? Este temor desproporcional e quase irracional que muitos homens sentem a respeito das mulheres notáveis, que tem muitos outros atributos além da discrição, nos faz pensar seriamente que as mulheres realmente têm muito a dizer , a fazer e a transformar. Caso contrário o nosso silêncio não seria tão recompensado com elogios piegas e transas meia boca.”
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Sim, deveríamos ser mais feiticeiras do que princesas. Como vi na peça teatral “A alma imoral”, baseada do livro homônimo de Nilton Bonder e adaptada para o teatro pela atriz Clarice Niskier, as mulheres estão se esquecendo da nossa missão no mundo: trair a tradição.
Tanto o livro como a peça são saborosas e instigantes mesclas entre filosofia e teologia judaica. Muitas vezes, precisamos trair a tradição para manter o que existe de essencial. E diferentemente do que foi pregado e defendido exaustivamente durante mais de 2 milênios de patriarcado, não é da natureza da mulher se submeter. A mulher não veio ao mundo para se adequar. Nós viemos ao mundo para questionar o status quo e promover mudanças. Nós viemos ao mundo para transgredir a lei nua e crua , a lei dura. Sim, somos agentes transformadores: curiosas, ambíguas, sedutoras, destemidas, irreverentes e devastadoramente amorosas.
Mas infelizmente o que mais vemos são mulheres tentando o tempo todo seguir um severo script social para serem aceitas pelos homens e depois de muito sacrifício, receberem um torrão de açúcar e uma acariciada na cabeça como fazem com os cães dóceis, ao som de um elogio meloso, que nas entrelinhas significa simplesmente que a mulher em questão está cumprindo o seu papel de deixar o homem guiar, brilhar, decidir. Aos homens cabe fazer e acontecer. Saber e entender. A nós , cabe entrar num modelito 36 , nos equilibrar num salto dez e dar um sorrisinho polido de frígida.
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Quantos homens não escolhem uma mulher pela discrição? Pela capacidade de se manterem sempre um passo atrás, quietas, convenientes, assépticas, domadas, praticamente invisíveis ou fulgurantes como um belo objeto decorativo?
Por que a voz das mulheres ainda incomoda tanto? Por que ainda precisamos ser amordaçadas simbolicamente? Este temor desproporcional e quase irracional que muitos homens sentem a respeito das mulheres notáveis, que tem muitos outros atributos além da discrição, nos faz pensar seriamente que as mulheres realmente têm muito a dizer , a fazer e a transformar. Caso contrário o nosso silêncio não seria tão recompensado com elogios piegas e transas meia boca.
Obviamente , existem homens capazes de se deslumbrar com a nossa luz e beber dela numa deliciosa dança erótica em que ambas as partes crescem e brilham juntas. Muitas vezes, socialmente falando, os homens considerados mais fragilizados são os mais poderosos porque não se deixam intimidar pelas mulheres fortes. Ao contrário. Ao invés de oprimi-las ou fugir delas, as enfrentam e as admiram ou as amam loucamente. Conversam de igual para igual. Chamam para sair. As transformam em suas parceiras afetivas ou grandes amigas.
Sim, meninas. Deveríamos ser mais feiticeiras do que princesas. Deveríamos gastar menos tempo decorando o que podemos e o que não podemos fazer para agradar nossos parceiros e investir o nosso ouro naquilo que sabemos fazer de melhor: revolucionar.