Desnudando a alma… – Tabu. O corpo tão comum, tão nosso e o esconderijo.
As roupas não somente nos cobrem, como também cobrem sonhos, aceitação, admiração da nossa própria matéria. Magros, gordos, altos, baixos, apenas corpos. Corpos que não são devidamente admirados pelos donos, por nós. Vemos defeitos nas curvas do corpo e nas curvas da alma.
Almas também andam vestidas. Despir-se tem sido cada vez mais difícil: o corpo despido não pode ter imperfeições e a alma não pode ser o que quer. Escondemos o que temos de melhor por não nos encaixarmos no padrão: o de beleza vigente e o de vida perfeita.
É ditadura para todos os lados. É uma ditadura sem fim. A busca é pelo corpo com 0% de gordura e músculos torneados.
Aparentemente, essa é a única forma das curvas serem apreciáveis e belas. Todo resto não merece admiração. E nós, meros mortais, vivemos em uma eterna briga com o espelho. Uma briga que não é por saúde, uma briga que nasce da vontade de se encaixar no que dizem ser mais bonito.
Os defeitos oscilam do corpo para alma, da alma para o corpo. Quando cismamos em achar defeito a lista jamais se finda. E o pneuzinho que incansavelmente aumentamos a cada vez que vemos o corpo refletido, já não é mais o único problema. O olhar que desvaloriza o corpo já crucifica ferozmente os erros de uma alma perfeitamente imperfeita. O olhar mudou. O olhar cegou, distorce o que reflete. Não se enxerga de dentro para fora. O olhar ficou apenas na superfície e ir, além disso, não interessa. O raso é falho e não perdoa as próprias falhas.
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A ditadura do corpo perfeito nos adoece cada vez mais. Adoece essas cabeças já tão atordoadas pela corrida que o tempo resolve dar.
Pelo tempo que nos é tomado pelo trabalho e afazeres. Pelo tempo que é cada dia mais dos outros do que nosso. E mais uma ordem a ser obedecida não nos cabe. Falta tempo para olhar e contemplar para si, falta tempo para cuidar. E esse tempo efêmero acaba se tornando depressão, bulimia, anorexia e tantas outras doenças “modernas”. A névoa já não sai dos olhos.
Um gesto. Uma parada. Uma respiração mais longa. Um olhar sem julgamento. Um elogio de coração. Um convite a pensar diferente. Uma situação. É simples o que pode mudar esse panorama. Um olhar de fora que pode lhe fazer ir pra dentro. Uma imagem que pode levar a contemplação de si mesma. Uma admiração que enxerga a beleza dor corpo e perdoa cada imperfeição da alma. Apenas um simples movimento pode iluminar esse olhar tão pouco amigo de si, olhar esse que não ama as curvas que tem. Curvas naturalmente belas e que tanto fugimos de valorizar.
Corpos livres, assim como as almas. Corpos nus que podem despir almas. Corpos também vestidos que tiram da alma o peso de não libertar-se. Um convite que pode ser feito por qualquer um. Um convite que podemos fazer a nós mesmos. Apenas uma sugestão de olhar para si mesmo de outra forma. Um exercício diário em frente ao espelho. Um ensaio fotográfico para enxergar a si mesmo por outro olhar. Uma conversa com pessoas que tanto superaram ao ir à contramão dessa perfeição ditada, pessoas que amam seu corpo e toda a sua beleza. Histórias de almas que se permitiram ser quem são, amando cada defeitinho que vem no pacote da humanidade.
Vivemos em tempos onde é mais fácil despir-se um corpo que uma alma. Vivemos em tempos onde usamos o corpo como esconderijo da alma.
Tempos onde nossas curvas viram uma estrada que não nos orgulhamos de percorrer. Tempos em que nos distanciamos de nós mesmos e dos outros. Tempos onde precisamos de coragem para nos despir das regras que nos são impostas. Tempos em que chamamos de milagre quando alguém adentra nossa estrada para nos abrir os olhos para nós mesmo. Procuramos enumerar defeitos no corpo para não enxergar todas as outras barreiras criadas em nós. Em tempos tão rasos, que nosso ato de coragem seja despir orgulhosamente o corpo e a alma.