O rapper usou as redes sociais para compartilhar sua conquista com fãs e seguidores, que o parabenizaram por servir de inspiração às pessoas da periferia.
A realidade de quem nasce nas regiões periféricas e nas favelas do Brasil está muito distante de ser fácil. Precisando encarar, desde a mais tenra infância, problemas como a ausência de segurança pública, saneamento básico, educação de qualidade e estrutura, os jovens acabam expostos ao tráfico de drogas e à criminalidade.
A necessidade de ajudar a família também surge para a maioria dos adolescentes pobres, que acabam precisando conciliar estudo com trabalhos mal-remunerados ou simplesmente se veem impelidos a abandonar a escola. As consequências acabam sendo a perpetuação da pobreza e da marginalização da classe populacional mais vulnerável do país, que em sua maioria é composta de negros e pardos, já que, estruturalmente, o Brasil também carrega em seu cerne o racismo.
Quando uma pessoa da periferia vence, carrega consigo não apenas uma alegria individualista, mas é capaz de inspirar e ajudar outros milhões que estão na mesma situação, mas não enxergam saída para suas mazelas. Dentre as principais formas de veiculação da realidade periférica, a arte é a que mais se destaca.
A música, os filmes e os artistas que se tornam influência no Brasil e no mundo falam, em sua maioria, do verdadeiro contexto dos bairros e das comunidades mais pobres. Estilos musicais, como o rap e o funk, trazem consigo essa veia social, tornando-se um movimento eloquente com força suficiente para atravessar oceanos.
Eduardo Taddeo, um dos nomes mais proeminentes do rap nacional, publicou em 12 de janeiro, em seu perfil do Instagram, a notícia de que tinha sido aprovado no Exame de Ordem da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O artista aproveitou o momento para deixar uma importante reflexão para os fãs, que fizeram questão de o parabenizar e reforçar o quanto ele é considerado uma inspiração para os jovens que nasceram e nascem em regiões vulneráveis.
Na publicação, o ex-integrante do grupo “Facção Central” disse que sempre disse, nas músicas ou nas palestras, que as pessoas da periferia não devem ser limitadas às conquistas apenas na música ou no esporte, “A nossa única diferença para a ‘playboyzada’ é que eles herdam as facilidades e nós a fome e os tiros da polícia”. O cantor compartilhou uma foto do seu resultado no Exame de Ordem.
O texto de Eduardo ainda abordou a questão que ele tanto explorou em suas músicas, a de que é possível sim conquistar os objetivos traçados, mas que é preciso muito mais empenho e dedicação, já que as condições sociais e até mesmo a sociedade acabam criando obstáculos para que o sonho não se realize.
O rapper afirmou que, depois de cinco anos de “um intenso e tenso” curso de Direito, conseguiu ser aprovado na OAB. “Para desespero do sistema, o filho da pedinte lá do cortiço do centro de São Paulo, além de rapper, agora é Doutor”, enfatizou Eduardo. Finalizando sua publicação, ele ainda pediu que todos acreditem no próprio potencial, porque ele acredita.
“Facção Central”
O grupo de rap foi formado em 1989, na capital paulista, mas Eduardo Taddeo entrou apenas depois que Jurandir e Mag saíram. Ao lado de Dum-Dum e DJ Garga, posteriormente substituído por Erick 12, os jovens que cresceram em cortiços cantavam com fúria a realidade que viviam. Considerados um dos grupos que mais fizeram oposição ao governo, os integrantes usaram a violência como principal inspiração para as letras.
“Facção Central” sofreu uma das mais duras censuras da história da música já na democracia. Em 1999, lançou o single “Isso aqui é uma guerra”, considerada uma das letras mais fortes e pesadas do rap nacional. No ano seguinte, para reforçar a mensagem que queriam passar, os integrantes lançaram o clipe, que foi veiculado na MTV por pouco tempo.
Considerado apologia ao crime por incitar o roubo de casas, sequestro, porte ilegal de armas, homicídio, latrocínio e liberação de presos mediante violência, o clipe foi vetado, assim como a música, e o juiz Maurício Lemos Porto Alves ainda determinou que o álbum não podia mais ser vendido no país. Os integrantes ainda ficaram presos por algum tempo (curto), acusados de apologia ao crime.
De acordo com reportagem da Folha de S. Paulo, de 2000, Eduardo Taddeo afirmou que a justiça tinha interpretado a música e o clipe de maneira equivocada. De acordo com ele, a intenção era mostrar que o criminoso afeta a sociedade se ela “não se esconde em um carro blindado” e que o principal objetivo do grupo era mostrar que a comunidade pode ajudar.
Depois de desavenças com os integrantes, em 2013, Eduardo Taddeo deixou o “Facção Central”, mas seguiu carreira solo como rapper, além de fazer palestras pelo Brasil.