Antes de viajar para Portugal havia um dilema: como levar um guarda-roupas inteiro em uma mala de viagem média? Lembro de sentar à beira da cama, olhar para aquele monte de cabides com peças coloridas e relembrar cada vez que eu fui infeliz por não ter a roupa certa. Não foram uma, nem duas vezes. Era um roteiro pronto: – Eu nunca tenho roupas.
E assim eu viajei, sem roupas, mas com uma mala tão cheia que só de lembrar, dói. O peso dela dói nas costas, nos braços e na consciência por eu ter sido tão infeliz e tão ingrata com tantas opções. Ano passado eu assisti ao vídeo “O paradoxo da escolha“, de Barry Schwartz. Ele diz que, por teoria, se quisermos maximizar o bem-estar dos cidadãos, o caminho é maximizar as liberdades individuais, pois a liberdade é boa, compensadora, valiosa e essencial. “Isso significa que todo dia ao acordar de manhã, você tem que decidir que tipo de pessoa quer ser. Em qualquer lugar que olhamos, coisas grandes e pequenas, materiais e comportamentais, a vida é uma questão de escolha”, afirma.
Mas ele levanta um ponto importante: quando você faz uma escolha, está escolhendo não fazer outras coisas. E essas outras coisas, em um segundo momento, podem ser muito mais atraentes do que aquilo que está fazendo agora. Entendeu? Fiquei confusa, afinal, tudo que queremos é liberdade. É algo que travou guerras, que levantou bandeiras, que tomou de supetão a vida de muita gente.
O economista Dan Gilbert, em “A ciência surpreendente da felicidade” exemplifica isso em um experimento feito em Harvard. No curso de fotografia, estudantes entraram em uma sala escura de revelação, pegaram câmeras fotográficas e percorreram o campus para tirar 12 fotos, desde professores preferidos até alojamentos. Coisas que no futuro recordariam a universidade. Das 12, tiverem que escolher as duas melhores e a eles foi dito: qual destes dois retratos você vai nos dar? Escolha um deles e nos dê o outro.
Haviam dois grupos no experimento. Ao primeiro, foi dada a oportunidade de mudar de ideia sobre o retrato doado nos próximos dias. “Não se preocupe se mudar de opinião, a escolha é reversível”. Ao segundo grupo foi dito o contrário: “Faça sua escolha. Aliás, o correio está saindo, céus, em dois minutos para a Inglaterra. Você nunca verá o retrato de novo.”
Nos próximos dias, eles acompanharam a satisfação a respeito das fotos. Os alunos achavam que iriam gostar da foto que escolheram um pouco mais que da outra que doaram. Errado! As pessoas que estão presas à foto, que não podem mudar de ideia, realmente adoraram sua escolha. Já as pessoas que têm essa oportunidade, se afundam no dilema: devo trocar? Escolhi a melhor? Talvez esta não seja a melhor? Será que deixei a melhor lá? Elas passam a odiar a escolha que têm. Por quê? Segundo Gilbert, porque a condição reversível não é compatível com a síntese da felicidade.
Eu explico: quando você não tem opções, passa a conviver melhor com o que tem porque não existe a chance de ter algo diferente. Em resumo, você fica mais satisfeito, mais feliz. Em Portugal, eu tinha apenas dois ou três jeans, algumas camisetas de verão e eu sabia que era somente aquilo que eu poderia ter naquele momento. Não lamentava, não passava longos minutos em frente ao guarda-roupas, apenas pegava e vestia. Os primeiros dias foram dolorosos, mas ao longo das semanas, a praticidade falou mais alto. A condição irreversível falou mais alto. É uma forma sintetizada de felicidade.
Eu não estava ali para desfilar minhas opções pelas ruas da cidade velha do Porto, eu estava ali para viver algo maior. Como diz Schwartz, quando você faz uma escolha, está escolhendo não fazer outras coisas. Naquele momento, eu não tinha optado pelas minhas roupas e eu parei de ser infeliz pela falta delas. Eu tinha decidido viajar e abrir mão dos luxos que uma vida cômoda e estável proporciona.