“Ninguém é tão ignorante que não tenha algo a ensinar. Ninguém é tão sábio que não tenha algo a aprender.” – Blaise Pascal.
A frase que hoje se tornou uma espécie de ditado popular pertence, na verdade, ao filósofo Blaise Pascal. No entanto, como já pudemos perceber, não existe ideia que nasce repentinamente; ela já existia no “mundo das ideias”.
Dessa forma, mesmo que Pascal tenha reproduzido esses dizeres, a ideia que ele tenta passar, já havia sido, por muitas vezes e por muitos pensadores, difundida por meio de exemplos e também citações.
De fato, não há nesse mundo ou em qualquer outro alguma pessoa ignorante o bastante que não tenha nada para ensinar, ou mesmo sábia, de tal forma que já possua todo o conhecimento.
Vamos, por outro lado, conceber essa frase em um sentido um tanto mais amplo quanto ao aprender: podemos aprender também com outros animais, ou mesmo com coisas inanimadas.
A aprendizagem, na verdade, está mais no receptor do estímulo do que em seu criador. Ora, podemos falar das coisas mais belas que existem no mundo, se o ouvinte for desinteressado, nada ele poderá aprender.
Nesse sentido, nossa atenção é essencial ao nosso aprendizado. Mas em que realmente nós prestamos atenção? Na maioria das vezes apenas prestamos atenção em alguém a quem damos algum tipo de credibilidade, o que é realmente uma pena.
É uma pena porque, apesar de não contar os milagres, mas os santos, já escutei grandiosos ensinamentos e mesmo palavras acalentadoras de andarilhos. Tenho o costume de tentar tirar o melhor de todos os discursos que as pessoas me direcionam, sendo que muitas vezes escuto de pessoas próximas o clássico: “Mas ele nem quis dizer isso”.
Sim, é bem provável que muitas das interpretações que realizemos ao longo de nossas vidas não sejam a intenção original do criador do estímulo, mas devemos nos lembrar que o ouro não está no estímulo, mas no receptor, em quem o interpreta (da mesma forma como o ferro também está).
Para convalidar o que digo e não parecer que estou sozinho desvairadamente afirmando tanto, convoco ao meu auxílio uma fala de Sócrates, enquanto fazia sua defesa contra acusações que lhe impetraram, descrita no livro “Apologia de Sócrates”, escrito por Platão.
“Depois dos políticos, fui aos poetas trágicos, e dos ditirâmbicos fui aos outros, convencido de que, entre esses, eu me classificaria como mais ignorante do que eles. Tomando, portanto, os seus poemas, dentre os que me pareciam os mais bem-feitos, eu lhes perguntava o que queriam dizer, para aprender também eu alguma coisa com eles.
Agora, cidadãos atenienses, eu me envergonho de vos dizer a verdade; mas, também, devo manifestá-la. Pois que estou para afirmar que todos os presentes teriam discorrido sobre tais versos, quase melhor do que aqueles que os haviam feito”.
Podemos deduzir dessa passagem que Sócrates foi até os poetas convencido de que eles seriam mais sábios que ele, principalmente em virtude das grandes obras que eles haviam escrito. Porém, ao indagar-lhes acerca de suas obras, percebeu que sequer os grandes poetas tinham consciência da grandiosidade do que escreviam.
Desse modo, é forçoso concluir que o acaso faz grandes obras a todo momento, por intermédio de diversas pessoas, e que cabe a nós, e a mais ninguém, interpretar o nosso mundo e tudo ao nosso redor.
Cabendo a nós a interpretação do mundo, não existirá, portanto, atitude alguma que não seja digna de aprendizado, se com esses olhos nós as observarmos. Apesar de não ser o objetivo desse texto, vale dizer que nossas interpretações, nutridas por “manias de perseguição”, causam muitas vezes conflitos ao interpretar de uma forma errônea a situação; isso deve e pode ser controlado.
É imperioso que, ao ser alvo de algum estímulo (ação/fala/etc), limpemos nossa mente de todo o preconceito em relação à origem desse estímulo, para recebê-lo com neutralidade, para que ele tenha, de início, credibilidade suficiente para “sofrer” uma análise sensata.
Quando com a mente limpa, mesmo os estímulos essencialmente ruins se tornam uma lição de como “não fazer as coisas” ou como “não agir”. Como foi escrito no primeiro texto, quando decidimos que agiremos de forma justa e pacífica (não passiva), não devemos nos permitir sofrer influência dos maus estímulos, respondendo também com maus estímulos, mas sim manter-nos em um padrão superior de cognição, no qual podemos analisar e aprender com todo e qualquer estímulo.
Desta maneira, elevando nossa ação e nossa forma de interpretar o mundo, não haverá ninguém que seja incapaz de nos ensinar algo, assim como jamais nos sentiremos sabedores de tudo o que há, porque será perceptível que a cada dia um novo conhecimento é adquirido.
Assim, tornamo-nos conscientes de nossa ignorância e, por nos tornarmos conscientes disso, começamos nossa libertação espiritual. – “Só sei, que nada sei”. – Sócrates.
Forte abraço e uma boa semana!