A cena misturava desespero e impaciência. No check in de um aeroporto americano, num voo para o Brasil, um casal abria cada uma das quatro malas e mochilas abarrotadas e transferia, nervosamente, itens de uma para outra na tentativa de não ultrapassar a cota de 32 quilos por bagagem. Uma funcionária desolada pesava as malas e mostrava o visor da balança. Não cheguei a saber o desfecho da situação, que já durava uns 20 minutos – se tiveram que jogar artigos fora ou se pagaram pelo excesso -, porque chegou a minha vez e, como sempre, despachei minhas malas bem levinhas e saí carregando a mochila. Apesar de brasileira, meu sonho de consumo é viajar como uma europeia: puxando uma malinha de bordo. Acho chique tanto despojamento. Ainda não cheguei a esse ponto, mas estou verdadeiramente perseguindo esse caminho. No turismo e na vida.
Costumo dizer que o segredo de um bom passeio é viajar leve. Poder andar de transporte público sem dificuldades, subir e descer escadas sem precisar de ajuda, arrumar-se rapidamente com os poucos itens que estão na bagagem e economizar nas compras por não ter mesmo onde guardá-las fazem uma enorme diferença. A questão é como atingir este patamar de desapego quando as grandes preocupações são não sair nas fotos com a mesma roupa, comprar porque está barato, levar presentes para todos os amigos e familiares, rechear a casa com souvenirs e um sem número de motivos para comprar que só a cultura do consumismo explica.
O resultado está na cena descrita acima, mas muito além dela, no desperdício de recursos necessários à manutenção de um comportamento e um estilo de vida voltado à acumulação de bens materiais, à ostentação e à aparência. Quando falo “recursos”, refiro-me não só a tempo e dinheiro, mas sobretudo a energia, emoções, sonhos, aspirações, escolhas e renúncias. Assim como nas férias, viajar leve na vida requer uma grande dose de autoconhecimento e determinação de mudança. Abrir mão é a palavra de ordem. Saber quando e como abandonar o excesso é o pulo do gato para uma vida com menos exigências e cobranças.
Viver leve é sinônimo de bem-estar, de qualidade de vida. É decidir ter o essencial, não importa que significado isso tenha para você. Essencial é o contrário de supérfluo e basta ter em mente estes dois conceitos para fazer uma boa faxina na vida. O que você anda carregando que poderia jogar fora? Qual o seu excesso de bagagem? Da mesma forma que ao arrumar uma mala de viagem queremos colocar o guarda-roupa inteiro dentro com medo de precisar de algo, na vida também vamos colecionando itens que pensamos imprescindíveis à nossa felicidade. Não vivemos sem um determinado nível de renda, sem um determinado parceiro, sem determinados grupos de amigos, sem determinados hábitos e vícios, sem determinadas crenças.
Desfazer-se é fora de questão porque, na verdade, não queremos pensar sobre a inutilidade de nossas vidas. Vamos acumulando tranqueira com as desculpas mais racionais do mundo. A única irracionalidade é o peso que carregamos. E quando vergados pelo estresse, pelo sobrepeso, pela depressão ou por pura infelicidade decidimos abandonar o excesso de bagagem tem início uma transformação que só quem pratica o verdadeiro desapego reconhece.
Viajar leve traz liberdade, autonomia, foco nas experiências e no aprendizado, busca por prazeres genuínos e emoções positivas. Se você sente que carrega excesso de bagagem, é hora de aprender a fazer a mala apenas com itens essenciais. E, para isso, terá que aprender a discernir o fundamental do inútil e superficial.
Este é um processo que requer muito além de persistência e sabedoria, pois pode bater de frente com toda uma cultura familiar e profissional baseada no ter e no aparentar. Mas desde que você reconheça a importância de viver uma vida com mais leveza, duvido que não sinta, como eu, uma pontinha de inveja daquela turista que experimenta a máxima liberdade de carregar uma malinha de bordo numa viagem internacional.
Então, use essa imagem e desapegue-se de tudo o que está sobrando. Você pode escolher começar agora ou apenas nas próximas férias.