Piscianismos…
Dizem que somos loucos por sempre vermos a vida através de uma perspectiva esperançosa. Na verdade, eu prefiro assim. Nesse universo utópico em que me encontro diariamente submersa, construo cenários perfeitamente arquitetados para inspirar os melhores romances, cujos detalhes também são minuciosamente posicionados em seu devido lugar.
A verdade é que vivemos sob o controle das emoções mais puras que conseguimos resgatar da realidade, porque a ausência de amor é nosso pior castigo. Ainda que humanos, somos sensíveis até o ponto de idealizar situações, diálogos e momentos potencialmente especiais de que o cotidiano por tantas vezes nos priva.
Precisamos compartilhar sentimentos, temos almas extremamente suscetíveis à apreciação da arte e somos suficientemente infantis para – escolher – acreditar em magia. Somos amantes do novo, detalhistas: da visão ao tato; e sonhadores até ultrapassar o limite da consciência.
Por vezes nos sentimos solitários, naufragados nesse universo paralelo a que alcunhamos esconderijo. Frequentemente embaralhamos os sonhos e os revivemos de olhos abertos, e, ainda que possa ser duro o choque de separar nossas próprias dimensões, somos seres catalisadores de sentimentos.
Somos encorajadores do afeto, disseminadores dos clichês e – inevitavelmente – escritores de expectativas. Amantes da simplicidade, encaramos o sucesso como resultado de sorrisos autênticos e dispensamos a necessidade tamanha de ingressar nessa jornada sinuosa e inquieta a que os outros apelidaram de “crescer”.
Nós somos portadores de corações pulsantes em adrenalina, mas que buscam incessantemente pela calmaria. Somos os especialistas em ilustrar surpresas e distrações perigosas. Somos roteiristas de amores impossíveis, resenhistas de contos de fadas e vivemos alheios às realidades desapontadoras. Nós driblamos a dor com figuras de linguagem, mas a respeitamos, em toda a sua imprevisibilidade e a experimentamos sem máscaras, como a qualquer outra emoção.
Não somos tão frágeis, mas também não somos tão autossuficientes quanto nos fazemos parecer. Nós somos, ao contrário, excessivamente afetáveis! por vezes dramáticos, mas sempre esperançosos quanto às intenções alheias. Sobre mim, cabe dizer que a solidão alongada permitiu com que eu conhecesse minhas cicatrizes, meus delírios e tropeços, e, consequentemente, fortificasse as blindagens que estruturam uma armadura propositalmente penetrável por quem deseje enfeitar de flores essas engrenagens há tanto enferrujadas. Ao mesmo tempo em que acredito que não me encaixo nesse universo tão individualista e competitivo, sinto uma predisposição explosiva em remar contra a maré.
E, por mais improváveis que tais frases possam soar, para cada ser humano vazio que insiste em roubar-me a fé, de tempos em tempos, eu me sinto purificar, finalmente, porque, após dias e noites em claro, acompanhada apenas de papel e caneta, hoje me sinto confortável para reconhecer que a cada palavra que faz sangrar, há poesias inteiras capazes de reinspirar e restabelecer a calma.