Relacionamentos nos obrigam a tomar decisões. Sensatas ou abruptas, em frações de segundos, no calor do momento ou no calmo e sereno sofá de casa. Seja pra decidir a poltrona do cinema, o destino das próximas férias ou jogar tudo pro alto e aceitar aquela bendita e desastrosa proposta de trabalho no exterior. O amor nos testa com seu aglomerado de decisões.
Talvez o grande problema ocorra quando antecipamos essas decisões. Quando colocamos a dúvida à frente do amor. A incerteza guiando possibilidades. Afirmamos o insucesso antes de darmos as mãos, prevemos fatalidades enquanto gozamos de extrema saúde.
Há quem não se entregue por receio, medos ou incertezas. Usa do altruísmo. Diz não querer correr o risco de magoar a outra pessoa.
Não me levem a mal, mas o altruísmo, esse tão singelo sentimento, de nada representa no pré-amor.
Difícil enxergar um amor que não tenha qualquer resquício de dúvida. Um amor decorado, onde cada passo é previsto e milimetricamente pensado. Seria o fim das mais que bem-vindas descobertas. Ficamos presos a detalhes absolutamente vazios quando, na verdade, o medo encontra-se dentro de nós. Por não querermos enfrentar o que está logo adiante, imaginamo-nos nobres, divinos, à beira da santificação. Abrimos mão do amor na intenção de que o outro não sofra. Abrimos mão, mas apertamos o coração. Tapamos os olhos para a luz do sol. Vestimos nossa própria reclusão. Julgamo-nos merecedores. Dificultamos o amor por esquecermos da sua genuína simplicidade.
O medo da mágoa faz com que percamos a elegância do amor, e elegância, nesse caso, é naturalidade. Gostamos de fingir que o amor não é feito de mistérios. A maior dúvida de um casal surge quando não há mais dúvidas entre os dois. O receio de magoar o outro é a certeza em magoar si mesmo. É não esperar mais por sorrisos e por beijos, e sim gelar o capuccino da relação. Querer saber do que acontece e do que haverá de acontecer, e assim ter a falsa impressão caminhar pelo harém de um amor prefeito.
O medo da mágoa não nos dá o direito de criar expectativas, e isso é lindo em um casal, criar expectativas. Diria mais: a melhor amiga da mulher é a expectativa. Por bem ou por mal, na mágoa ou na realização, na certeza ou na dúvida.
Ter medo de magoar o outro é ter medo dos dias de amanhã, viver de indiferenças, sorrir com a boca de lágrimas. É medo de se enfrentar, de aguçar a própria curiosidade. É desistir de toda a poesia de uma vida a dois.
Não querer magoar já significa vasculhar mágoas.