E não amava ninguém…
A festa começou igual a qualquer outra. Peguei meu copo de tequila e me sentei próxima à saída de emergência. Chegou companhia, tive de conversar. Respondi da maneira mais simpática possível à típica lista de homem bonito e sem assunto em boate lotada. Profissão, hobby, série favorita, idade e status de relacionamento.
Um brinde, três músicas e algumas perguntas depois ele quis saber como estava o coração.
Se eu tinha alguém em mente, um amor não correspondido, amor platônico ou coisa assim. Respondi que não havia ninguém. E que eu não amava ninguém. Brinquei dizendo que eu era a própria Lili do Carlos Drummond de Andrade. Piada péssima, mas para minha sorte o moço era professor de Literatura Brasileira. Aí sorrimos. O papo ficou interessante, porém não trocamos mais do que números de telefone.
Três horas depois, estou em casa e sem sono. Talvez eu devesse ligar para o carinha da festa, mas estou ocupada demais tentando descobrir o que vai ser de mim agora que não sofro mais por amor. Oh, céus! Será que isso mata?
Não tenho mais o coração partido há tanto tempo que nem consigo lembrar o dia exato em que ele se fez inteiro, nem quando foi minha última recaída. Ou se eu jurei para mim mesma que precisava de um tempo sozinha.
Reviro meu bloco de notas. Coincidência ou não, já faz tempo que não escrevo. Sempre acreditei que o combustível da minha poesia era a dor de um amor mal resolvido. E enquanto preencho os espaços vazios no word, descubro que não era. Sou só preguiçosa, mesmo. E acomodada. E também adoro desviar do assunto. Mas continuando…
É isso mesmo? Eu não amo ninguém? Ao menos não no sentido de romance e platonismo, parece que é isso mesmo. Mas os meus pais eu ainda amo. E o meu cachorro, e um monte de gente que conheço. Mas amar no sentido louco, desesperado e insano, é isso.
Eu não amo ninguém. Desesperador? Libertador? Sei lá. Como é que isso foi acontecer?
Encaro as paredes por um segundo e olho para o passado como se as respostas estivessem lá. Mas não estão. Nem nas paredes e nem no passado. Desisto.
Meu telefone vibra e interrompe o silêncio barulhento dos meus pensamentos. É o cara da festa. Meu coração palpita, como se implorasse para ser feito em pedaços outra vez. Ah, coração barulhento… doido para transbordar de amor!
E lá vamos nós… mas essa história eu prefiro deixar para depois.
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