Na mitologia grega, o mito de medusa é um dos mais enigmáticos e curiosos; trata-se de uma criatura assustadora, uma mulher com cabelos de serpente, presas de bronze e asas de ouro.
Medusa fora um dia uma bela sacerdotisa no templo de Atena, portanto, não podia se relacionar com homens. Um dia, porém, seduzida por Poseidon, o deus dos mares, deitou-se com ele no templo da deusa. Ao constatar o fato, Atena a castiga, transformando seu cabelo em serpentes e seu rosto adquire uma forma assustadora, que transforma qualquer criatura que a olhe nos olhos em pedra.
Medusa, em sua solitária existência, é ainda mais trágica do que midas, que em tudo o que toca transforma em ouro; medusa não pode sequer direcionar o seu olhar.
Se fizermos uma breve reflexão acerca das nossas relações pessoais, sejam elas com amigos, colegas, familiares, esposos (as) e namorados (as) temos nós também esta tendência: “petrificar” a imagem do outro e pouco ser receptivos ou abertos às mudanças. Ficamos paralisados em nossas ações, porque nos relacionamos com a imagem que fizemos do outro, como uma espécie de “fotografia”; não com quem de fato se apresenta naquele momento e circunstância.
As pessoas, porém, são “fotografias” vivas, em constante movimento. Então acontece algo trágico e muitas vezes inevitável: temos os mesmos comportamentos do passado, para situações presentes, totalmente diferentes. Estamos nós também petrificados, assim como no mito, pois ela também representa o que de mais assombroso podemos enxergar em nós mesmos: necessitamos de um escudo espelhado (o outro, para se proteger e ao mesmo tempo se ver) sem que nesse processo eu fique paralisado e morra, ao me deparar com meus aspectos mais monstruosos e inconcebíveis: os preconceitos, raivas, traumas e o ódio que existem em mim.
Não somos perfeitos e sabemos disso, mas temos a tendência de apontar as falhas e defeitos dos outros, perdendo um tempo precioso que deveria ser usado no próprio crescimento e desenvolvimento!
E é nas relações com os outros que podemos nos enxergar e descobrir aspectos que ainda não conhecemos em nós mesmos ou que resistimos em admitir.
Meu olhar tem a capacidade de paralisar os outros e, por muito insistir em velhas atitudes, acabo também me paralisando: a estagnação dessa energia psíquica representa a morte. Na natureza, apenas não se transforma o que não está vivo e isso também se aplica a nossa realidade.
Se sou alvo do olhar aterrorizante da “medusa”, sou petrificado, a partir do momento em que aceito o papel ou lugar no qual sou colocado, papel designado pela fala do outro, não pensando em possibilidades diferentes de agir, ser e existir no mundo e pior: não permitindo essa mudança de papéis aos outros.
Há então uma linha muito tênue entre crescer e aprender com as relações, a partir do olhar do outro e usar o olhar do outro para assumir um papel petrificado e único!
Se formos capazes de nos enxergar através do reflexo e melhorar aspectos que nos prejudicam ou prejudicam aos outros, talvez possamos ascender aos céus como Pégaso, um dos filhos de medusa que nasce com a decapitação da mãe, representativo da poesia, amor, criatividade e elevação espirituais, ao invés de sermos transformados em estátuas.
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