Palavras alvas do olhar… – Há algo de divino nas boas palavras que jorram na fala do olhar.
Gosto dessa eloquência, advinda na mensagem do silêncio. E sinto-me tocada, abraçada, no mais profundo de meu ser.
Só quem já experimentou esse instante, em que a ternura dialoga em tranquilas sílabas, sabe como é ser uma borboleta flutuante de sorriso etéreo. Sabe da suavidade das palavras aveludadas, dessa fala rara, que só os olhos são capazes de dizer.
É preciso que haja um acordo estabelecido de quem vê e de quem diz, para que as palavras formem um sentido.
Alguns são incapazes de decifrá-las. Outros sofrem, por não saberem retribuí-las. E há os que nem percebem…
Em vez de nos aprimorarmos, tanto nas palavras de nossa língua falada como na escrita, deveríamos ter em mãos a cartilha do olhar.
A palavra, com voz, me assusta… a cada dia um pouco mais. Recuo diante desse abstrato hálito, desse bafejo poderoso, explodindo no ar como bombas destruidoras.
As palavras da animosidade não usam apenas a boca como uma saída, uma porta, para se esvaziar. Ela é como um polvo gigante de olhos flamejantes, face distorcida, e corpo cheio de tentáculos, sofrendo o desequilíbrio de uma alma alucinada.
Somos palco da coreografia dos sentimentos; e a coreografia da raiva retrata um ballet insano e, muitas vezes, sem razão.
Diferente do amor, o ódio flameja como um incêndio descontrolado, que queima, destrói, ou deixa em feridas.
E tem a outra – a da indiferença – que nega o direito de ser ouvida, desviando o olhar. Essa não deixa ferida. Mas dói. Dói tanto como se a tivéssemos ouvido!
Assustadoras são aquelas que ricocheteiam, como a bala perdida. Surgem de fonte desconhecida e, sem nenhum plano preconcebido, atingem, ferindo mortalmente.
Experimento na pele, o gume de todas: ácidas, amargas, ressentidas e falsas.
E há tantas outras que machucam… Tantas, que não queremos ouvi-las… e as ouvimos! Tantas, que não queríamos dizer… e as dizemos!
Por uma única palavra errada, perde-se o amigo, o cônjuge, o filho, e divide-se a família.
Perdem-se grandes oportunidades. Perde-se o vizinho, uma cidade, um país, a liberdade, o mar!
Se todos reconhecessem o efeito devastador que a palavra mal dita (maldita?) é capaz de causar, emudeceriam. Falariam por mímica, ou colocariam em prática a voz dos olhos que, mesmo irados, cheios de chispas negativas, causam menos impacto, e menos danos.
Sempre amei e busquei as multidões. E nunca tive medo de encarar os olhares ferozes que me atravessaram, vez ou outra. O amadurecimento ensinou-me a desviar, evitando a colisão e tomando atalhos menos perigosos.
Cansei! Não quero mais atropelar e nem ser atropelada!
Aprendi a esquivar-me das almas turbulentas, e buscar a brisa no olhar de quem carrega a Paz. E, quando não a encontro, busco a planura da solidão, limpa de palavras das humanas loucuras.
É o instante em que minha alma se transporta à sala onde Deus se assenta.
Pacientemente, ele me ouve, compreendendo tudo e livrando-me dos julgamentos injustos de juízes nascidos da raiva, da inveja, ou de sua própria infelicidade.
Meus ouvidos estão fechados para esse martelo condenatório, onde soam os verbos letais.
A palavra lavada é todo o alimento que minha nascente e foz necessitam.
Tenho, nas palavras de minha solidão, a leveza da boa companhia, pois eu as torno, alvas como flocos de neve… cada vez que as invento!
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