Toda dor de um luto por quem se ama se torna mais intensa e dolorosa quando presenciamos nossa própria finitude humana
A finitude da vida é uma das poucas coisas de que temos certeza em nossa existência conturbada. Ainda existem inúmeras discussões – infindáveis, alguns diriam – sobre para onde vamos depois daqui, mas uma coisa é certa: tal qual a antiga e emblemática citação em latim, “memento mori”, lembre-se que morrerás.
Desde a infância até a idade adulta, temos dificuldade para lidar com a partida dos outros, desde os mais queridos até presenças pequenas em nosso dia a dia, que pareciam não fazer diferença, mas a partir do momento em que sabemos que não as teremos mais, o peito aperta e somos invadidos por sensação avassaladora de luto.
A morte simboliza uma perda difícil de lidar, pois é eterna. É como se a pessoa não morresse apenas quando seu óbito foi anunciado, mas um pouquinho a cada vez que aqueles que deixou para trás se lembrassem da sua ausência ou até começassem a deixar as lembranças do falecido serem levadas pelo vento das novas experiências.
Para alguns, é o medo de esquecer a voz de um ente querido que se foi cedo demais. Outros se apegam de todas as formas possíveis e imagináveis ao cheiro daquele que amava e hoje mora no outro plano. Se a morte, mesmo sendo nossa velha conhecida, causa tanto pavor e dúvida quando observada nos outros, o que dirá em nós mesmos?
E antes que você jogue fora tudo o que já foi dito nesta reflexão, simplesmente por não acreditar que seja verdade, permaneça aqui. Você verá que é muito mais possível do que imagina e que alguém próximo a você – ou até você mesmo – pode estar passando por isso.
O que muitos não falam sobre luto, pois tudo o que envolve falecimento é um tabu na nossa sociedade, é que é possível e muito doloroso presenciar a decadência da própria saúde e corpo.
A confusão que se instala em nossos corações ao vermos um parente padecer aos poucos, principalmente por doenças de difícil tratamento, é potencializada em todas as forças quando o convalescente em questão somos nós mesmos. Imagine a revolta de perceber o seu tempo ir embora pelas suas mãos e, mesmo que tudo que pudesse ser feito já esteja em monção, não há mais o que se fazer.
O incerto toma conta de tudo, e cada segundo vivido vem com um misto de gratidão por mais uma lufada de oxigênio ser permitida para nós e raiva, pois do que adiantam mais alguns instantes, se o destino já está selado?
Parece clichê dizer isto, mas é real: sua vida passa diante de seus olhos. Se tiver de lhe dizer algo para analisar em vida, caso você esteja numa situação de luto pela própria existência – o que eu, sinceramente, espero que nunca aconteça –, é que em seus momentos finais você celebrará tudo que foi vivido, o bom e o ruim, e sentirá uma pontada no peito de remorso apenas por aquilo que não fez. Então hoje, enquanto ainda há vida, arrisque-se um pouco mais.
O fracasso de hoje é a memória que pode lhe acalentar em um momento em que a aceitação silenciosa de que tudo que podia acontecer já aconteceu é sua única fonte de acolhimento. Por fim, preciso ser honesta e admitir: não tenho respostas.
Infelizmente, este texto não poderá oferecer uma solução para o luto que você e aqueles à sua volta já sentem por você. Se tivesse de deixar alguma forma de “conselho”, seria para viver intensamente tudo o que se tem e não focar naquilo que faltou. E deixo essa dica para aqueles que gozam de boa saúde também. Abrace quem você ama e demonstre seu afeto, pois você não sabe se estará aqui amanhã. A verdade é que nenhum de nós nunca o saberá.