A primeira vez que ouvi uma mulher dizer que não teria filhos, foi como se o mundo tivesse parado por um instante. Precisei retomar a respiração e me situar novamente na conversa.
Eu e uma amiga, ambas com pouco mais de vinte anos, falávamos sobre os planos para o futuro, quando ela disse com toda a naturalidade que não seria mãe. Num susto, perguntei se era possível não ter filhos. Nunca tinha pensado nessa possibilidade. Naquela época, as poucas mulheres sem filhos que eu conhecia ou não tinham casado – e eram chamadas pejorativamente de solteironas, entre outros adjetivos do gênero –, ou tinham algum problema de saúde que as impedia de engravidar.
Minha amiga era jovem, saudável e tinha outros planos para sua vida. Com uma gargalhada, ela me respondeu que nenhuma mulher era obrigada a ser mãe. A maternidade era uma escolha.
O som daquelas palavras foi libertador. Até então, eu simplesmente aceitara a ideia do “crescei e multiplicai-vos”, como uma regra inquestionável. Apenas imaginava quando iria acontecer, como uma fatalidade.
Apesar do mundo novo que se abriu naquela conversa, eu não tomei minha decisão instantaneamente. Todo mundo falava que as mulheres eram dotadas de um instinto maternal e eu esperava que o tal instinto um dia aflorasse em mim. Tinha tempo. Ainda estava razoavelmente longe dos trinta anos, data limite para gerar um primeiro filho – depois dos trinta a possibilidade de ter complicações na gestação era muito grande, diziam, em tom ameaçador.
Ao invés de ver aflorar o instinto da maternidade, as conversas sobre o assunto me deixavam desconfortável. Era como se eu estivesse vestindo roupas ou sapatos apertados.
Algo ali não se encaixava em mim. À medida em que o tempo foi passando, mais mulheres passaram a falar sobre ser ou não ser mãe como uma opção e não como ato compulsório, e a ideia da maternidade foi ficando cada vez mais distante do meu imaginário.
Passei dos trinta sem instinto maternal, sem engravidar e sem crise. Comecei a me sentir confortável em assumir a decisão de não ser mãe. Ao me perguntarem sobre quando teria um bebê, passei a responder que não teria. A afirmação causava certo espanto em alguns, incredulidade em outros. E a vida seguiu. Não que o assunto tenha deixado de causar polêmica. Hoje, às vésperas de completar quarenta anos e recém-casada, sou ainda mais questionada sobre quando terei um bebê. Ao responder que não terei filhos, observo ares de dúvida e a velha afirmação de que eu digo isso agora, mas que logo vou mudar de opinião. Não vou.
Fique claro que eu não tenho absolutamente nada contra a maternidade. Tenho plena convicção de que o amor de mãe é o sentimento mais sublime que há, que gerar um ser humano é o maior milagre que existe.
Admiro totalmente as mulheres por esta capacidade incrível, mas temos o direito de escolher vivenciar ou não essa experiência, assim como qualquer outra.
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