O que mais gosto é de acompanhar o seu sono quando acordo antes e saber que me observa quando estou dormindo.
Dormir na mesma cama não é só dividir os travesseiros e o espaço. Não vou negar. Eu adoro dormir sozinha, ocupando cada centímetro da cama como se fosse a dona de uma ilha no Caribe. Dona e soberana.
Dormir na mesma cama exige mais do que querer estar junto, exige mais do que aquela paixão das primeiras semanas. É preciso um curso intensivo de “eu não sou a única pessoa do mundo que importa”.
Tem casal que dorme separado. Cada um mantendo o seu reinado, o seu próprio reino dentro da mesma casa. Onde a cama e os travesseiros não sofrem com a presença constante de intrusos. Pode manter seus livros, seu telemóvel com todos os despertadores que quiser, sua roupa arrumada ou não, onde lhe apetecer. Nem se preocupar com a luz acesa.
Pode fechar toda a janela e as cortinas e dormir naquela escuridão digna de um soberano. Ou deixar tudo aberto dia e noite e ter o seu sono abreviado com a luz do dia que nasce tão cedo, mas que gosta tanto. Não é preciso fazer concessões nem acordos e tanto mais, mudar alguma coisa no seu ritual ou suportar as manias do outro. Vamos namorar? É na minha cama ou na sua?
Tem casal que vive em casas diferentes. Tem casal que agenda e tem blocos de tempo para estarem juntos. E está certo assim, se ambos concordam que precisam manter a independência dentro da relação e focar-se nos momentos dos encontros, na expectativa do encontro e na solidão da ausência sentida e logo mais beber outra vez desse amor confortável sem a coisa toda do dia a dia. Vamos namorar? E sincronizam as agendas.
Eu sou moderna. Já experimentei estas soluções e digo, cada vez que me questionam, que ainda prefiro mesmo à moda antiga.
Nosso amor deve ser compartilhado no espaço da cama e na mesa de cada café que tomamos juntos.
Incomoda-me os travesseiros amarrotados. Mas sei que incomodo com a minha mania de dominar os espaços. De fazer do meu jeito. O que mais gosto é acompanhar os seus rituais antes de adormecer nos seus braços. De acompanhar o seu sono quando acordo antes. E de saber que me observa quando estou dormindo.
Não me serve a regra de não ficar tão junto para não ficar dependente. Na verdade ficamos é sensíveis ao outro. Ao que se passa com o outro. Descobrimos que além do nosso mundo perfeito, há o mundo do outro para explorarmos, na ternura de ouví-lo, acompanhar as marés e as flutuações do seu humor.
Dividir não só a cama, mas os pensamentos, colaborar com as soluções e eliminar as preocupações.
É o conforto do abraço nas noites mais escuras, metáfora para os dias complicados e difíceis que temos que dão a segurança de que não estamos sós nessa luta que é viver e concretizar o que planeamos. Os sonhos já não são solteiros.
Não troco por nada a cumplicidade debaixo dos lençóis, território neutro compartilhado de comum acordo. Não é preciso agendar nem propor: “Vamos namorar?”
Já estamos ali, olho no olho e basta-nos o querer. Despimo-nos ao pé cama e deixamos lá as vergonhas e as vírgulas. E então assumimos os nossos papéis onde somos o que quisermos ser para o outro, noite após noite. Roteiro improvisado entre risadas e suspiros. Abre a janela. Agora fecha um pouquinho. Traz um copo d’água. Quer também um lanchinho? Vou descansar só uns cinco minutos e já levanto. Desliga o despertador. Estou com calor. Mais um cobertor ficava melhor. Onde estão os meus travesseiros? Hoje não. Hoje sim. Amanhã também. Não vai tomar banho? Então eu também não. Há sol ou chuva?
Vem cá e fica mais um bocadinho. Ainda é cedo. Dormir junto é acordar junto.
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