Nós aceleramos tanto, mas tanto, que nem conseguimos acompanhar o ritmo que se perpetrou na nossa vida, e descemos embalados a ribanceira.
“… Alice perguntou: Gato Cheshire, pode me dizer qual o caminho que eu devo tomar? – Isso depende muito do lugar para onde você quer ir – disse o Gato. Eu não sei para onde ir! – disse Alice. Se você não sabe para onde ir, qualquer caminho serve.” (Alice no País das Maravilhas – Lewis Carroll)
Nessa avidez em que vivemos nos últimos tempos, não nos damos conta nem mesmo do porquê de estarmos todos os dias fazendo o que costumamos fazer. Repetimos os nossos movimentos, às vezes, de forma tão automática que, quando nos damos conta, queríamos ir para outra direção, mas o nosso piloto automático nos condicionou a irmos pelo mesmo lugar de sempre.
Nós nos habituamos a viver de forma instantânea, líquida, na era da “modernidade líquida”, termo criado pelo magnífico sociólogo e filósofo polonês Zigmunt Bauman, que nos remete a uma profunda reflexão acerca da fluidez que transcorre pela nossa vivência contemporânea e que suplantou, de forma abrupta, o terreno sólido, no qual criamos as nossas bases comportamentais no século XX.
Fomos acometidos por um sentimento de vazio, não obstante as muitas atividades diárias, ao mesmo tempo em que não temos “tempo” para nada.
Estamos cercados de informações e esvaziados de conhecimento. Temos um milhão de amigos nas redes sociais mas, muitas vezes, nenhum com quem desabafar. Postamos falsas verdades o tempo todo, uma face sem rugas que já não possuímos mais, uma barriga sarada desenhada em um aplicativo, tudo isso somente para sermos aceitos nessa nova “sociedade virtual”. Sociedade esta, ressalto, que possui regras duras, implacáveis, que de tão inatingíveis têm tocado no calcanhar de Aquiles do gigante humano e aumentado o número de suicídios em todo o mundo. Você certamente conhece ou já conheceu alguém que sofre ou sofreu de depressão ou tem algum transtorno psicológico.
Embora estejamos na era da tecnologia, na qual encontramos respostas rápidas para praticamente tudo no nosso “oráculo moderno: Google”, jamais na história da humanidade houve tantas fórmulas e receitas que prometem nos ajudar a encontrar a tão sonhada “paz” espiritual, seja na religião, nos livros de autoajuda, nas práticas meditativas, nos templos etc.
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Nós aceleramos tanto, mas tanto, que nem conseguimos acompanhar o ritmo que se perpetrou na nossa vida, e descemos embalados a ribanceira. Muitas vezes, ao chegarmos lá embaixo, estamos tão machucados que não conseguimos mais recuperar o tempo perdido, ou a ferida demora a cicatrizar. Algumas vezes, precisamos de anos de terapia e ainda assim não conseguimos sair do caos, pois como dizia o rei Salomão: “Tudo é vaidade e um esforço para alcançar o vento!” Sábias palavras!
De que adianta colocarmos obstáculos altos na nossa frente se, ao final do dia, não temos forças nem para subir num banquinho? Vivemos abarcados de cursos, trabalhos variados, especializações, posts na internet, reuniões, atendimentos, academia, shakes, fast food, mais posts, falsidade, vaidade exorbitante, cobranças, metas, etc. que, quando nos damos conta, nem sabemos mais aonde queremos chegar. Estamos caminhando sem destino e perdendo as forças no meio da caminhada.
Algumas vezes, no apogeu do desenvolvimento espiritual, chegamos à conclusão de que não precisamos chegar a lugar nenhum, provar nada para ninguém… E lá se foram os degraus da pirâmide de Maslow!
Descobrimos que deixar a vida nos levar também não é a solução, pois o nosso piloto automático está na velocidade máxima e acabamos repetindo os nossos erros diariamente, modelando-os em forma de hábito.
Portanto, é preciso rever as nossas metas existenciais e extrair daquilo que achamos que é importante o que verdadeiramente importa, o que faz sorrir a nossa essência, não a nossa aparência, o que faz pulsar o nosso coração e não as nossas falsas abstrações, o que dá sentido à nossa vida real e não à nossa vida virtual.
Conforme nos ensinou Bauman: “A vida é muito maior que a soma de seus momentos.”
Direitos autorais da imagem de capa: william Krause/Unsplash.