Cada existência, independentemente de sua forma, confere a nós este status pessoal e intransferível: cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.
E isto é suficiente para nos impedir de medir o outro com a nossa régua. Não é por saber de onde alguém veio e para onde vai que se pode julgar como o outro anda. Talvez seja possível apenas traçar o seu roteiro. Mas de quem são os pés que sentiram o calor do solo? Talvez os sapatos apertados, as bolhas, os calos?
Eu não senti e é justamente por isso, que não me cabe fazer projeções sobre a jornada do outro. Ainda que seja mais fácil julgar, avaliar, criticar.
Este é um fato. Cada um tem a sua própria jornada a percorrer. Sobre isso não é possível andar na trilha do outro, nem pegar atalho.
A parte do atalho é a mais perigosa. Por um momento parece que podemos evitar escalar as montanhas e descer os vales da nossa jornada. O atalho é como uma zona de conforto, uma muleta, quando na verdade não passa um placebo.
Nessa jornada pessoal não dá para cortar caminho. Os atalhos apenas nos atrasam. É como um jogo de tabuleiro ele vai te levar para aquela casa onde está escrito “Você perdeu tudo, volte ao começo do jogo”.
Mas reside justamente em cada um saber a “dor e a delícia de ser o que é” que vamos fazer de tudo, para evitar a dor e buscar somente as delícias. Isso inclui pegar atalhos e, para isso, nenhuma força será poupada.
Trilhar a jornada da vida do jeito que tem que ser é assustador. Primeiro porque se faz sozinho. Nesta trilha só cabe uma pessoa e enfrentar a solidão será o primeiro dos desafios.
Do outro lado dessa angústia você aprenderá a ser a sua melhor companhia e conseguirá ouvir a sua própria voz, e ela te dirá coisas que você jamais imaginou sobre você mesmo. Então você aprenderá que não precisa usar pessoas como atalho.
Também não há como garantir que será uma jornada confortável ou segura. Os riscos estarão em cada passo que você der. Será necessário muito esforço. Suas habilidades serão testadas e você ressignificará conceitos como paciência e perseverança.
Em alguns trechos você cairá, é verdade, e é graças a isso que se dará conta de que vai se levantar sozinho. Então você entenderá que os atalhos são grandes armadilhas, pois “cortar caminho” não passa de autossabotagem.
Cada um tem seu próprio caminho. Isso significa que os caminhos não são iguais e, por serem diferentes, é possível pensarmos que há caminhos mais fáceis outros mais difíceis, uns longos, outros mais curtos, uns mais sinuosos, outros mais áridos.
Mesmo que tudo isso seja verdade (nunca saberemos justamente por conta da régua), ainda assim não faria sentido porque “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”, o que nos leva a entender que cada um terá o caminho que lhe for designado.
Só saberemos a dor e a delícia de sermos o que somos quando passarmos pela dor e pela delícia, até lá, viveremos de atalho em atalho.
Direitos autorais da imagem de capa: .wallpapermaiden / 2754