Você quer ser feliz agora?
Amor-próprio. Quem nunca ouviu esse nome? Hoje em dia o amor próprio é sacralizado, quase como uma divindade que permeia o imaginário coletivo. Mas até que ponto não o colocamos no lugar de um ideal inalcançável, apenas para, inconscientemente, postergar nossa felicidade?
Às vezes acho que as pessoas confundem autoconhecimento com amor-próprio. O primeiro acontece de forma natural, conforme vamos vivendo.
Conviver é a forma mais genuína de nos conhecer. É a partir das semelhanças e diferenças alheias que conseguimos criar um parâmetro de autocrítica e assim escolher o que é mais saudável e agradável para a gente.
A partir das relações sociais desenvolvemos nossos limites internos.
O mecanismo é simples: você convive, entra em contato com as diferenças do outro, percebe que o que o satisfaz, não necessariamente satisfaz a você, busca por outras possibilidades que lhe agradam, identifica-se com algumas, realiza-se como indivíduo, escolhe ser daquele jeito e se reconhece nas suas ações, cria hábitos e desenvolve os seus limites. Essa última etapa ratifica o autoconhecimento.
Seus limites criam uma barreira entre o que você sente que o faz bem e o que o outro sente que faz bem para ele, projetando um desejo em você. É nesse momento que afastamos tudo que não é saudável. E isso é ótimo! Mas é natural.
Na verdade, vivemos o mecanismo do autoconhecimento, a todo instante, desde que colocamos os pés para fora de casa e até mesmo quando estamos sozinhos refletindo sobre as nossas decisões. Desde que nascemos até o dia da nossa morte.
A minha crítica ao amor-próprio é porque muitas vezes sinto que ele atua como uma linha de chegada, um objetivo a ser alcançado. Quem nunca ouviu: “Você precisa ter mais amor-próprio.”
Vejo muitas coisas erradas nessa frase. O “precisa”, remete-me a uma ideia de necessidade, carência de algo. E o “ter” remete-me a uma ideia de posse, quantidade. Quem não tem, está na falta.
Nas entrelinhas, o que é dito nessa frase, é: “Você não tem. É carente disso. Enquanto não tiver, não vai conseguir.”
A partir dessa lógica, qualquer sentimento de medo, dor, agonia e desespero, é motivo para estarmos longe do amor-próprio, que atua quase como um título acadêmico. Quem não possui amor-próprio, não é digno de ser feliz.
Assim, inconscientemente, absorvemos a ideia da falta, incapacidade, inferioridade. Esses estímulos negativos, não só denigrem nossa autoimagem, como provocam supervalorização da vida alheia, ansiedade extrema para alcançar as “dádivas” do amor-próprio, e depressão por ainda não nos sentirmos esse ser humano ideal.
Calma. Respire. Está tudo certo. Medo, dor, agonia, desespero, fazem parte dos sentimentos que compõem nossa convivência com as diferenças do próximo. Eles indicam o quanto nossos limites internos podem estar fraquejados e o quanto temos que continuar vivendo para entrar em contato com o que nos faz genuinamente feliz.
Só assim desenvolvemos nossa confiança interna.
O mecanismo do autoconhecimento está no ontem, no agora e no amanhã. Não é um objetivo, uma linha de chegada. É você e o mundo, juntos, caindo e levantando. Essa não linearidade da felicidade só acontece porque mudamos o tempo todo.
Quanto mais mudamos nossas escolhas, mais nos redescobrimos, outros valores absorvemos, outros limites criamos.
Tire o pé do acelerador e tenha calma. Você já pratica o amor. Conhecer a si mesmo é viver, viver é ser e ser é amar sua existência.
É claro que a pessoa que diz para ter mais amor-próprio não faz ideia do peso dessas palavras. Ela diz isso com muito boa intenção, visando nossa felicidade.
Mas espero que a partir desse texto, você sinta que o amor por você é simplesmente viver, fazer escolhas, e criar limites internos saudáveis.
A vida é agora e você pode ser feliz e pleno já. Não busque por um fim, seja o seu percurso.
Direitos autorais da imagem de capa: Vinicius Wiesehofer / Unsplash