É preciso dizer adeus ao passado. Levantar do chão, sair do estado de ruínas, sacudir os farrapos rasgados, enxugar as lágrimas e puxar os cabelos para trás. É preciso levantar a cabeça, olhar a vida de frente e dizer: eu consigo!
Eu consigo enfrentar o medo, esse monstro que me devora o pensamento e transforma o melhor de mim em ansiedade. Esse medo que me bloqueia e me impede de seguir em frente, livre, como um pássaro que esqueceu o que era voar quando abriram a sua gaiola.
É preciso dizer adeus ao passado. Dizer adeus a quem fez parte da nossa vida durante tanto tempo, por quem tanto fizemos, mas que pouco ou nada nos acrescentou, a não ser o conforto ilusório de uma vida segura que a gente nunca viveu. Dizer adeus ao passado não significa apagar essa parte de nós. Dizer adeus ao passado significa seguir em frente, confiante, ainda que o futuro seja tremendamente assustador. É dar passos pequenos, um de cada vez, caindo de tempos a tempos, não olhando nunca para trás.
Se olharmos para trás, ficaremos presos ao que tivemos, aquilo que foi e que não faz mais sentido no presente, porque simplesmente não existe. O que há é a lembrança, a recordação de alguém querido com quem partilhamos um período de tempo da caminhada da vida. Alguém com quem aprendemos a amar, a partilhar, a perdoar. Alguém a quem temos de saber renunciar porque simplesmente não nos faz feliz.
Dizer adeus ao passado é coisa de gente forte, de gente corajosa. Porque dizer adeus ao passado é quando você sabe que olha nos olhos daquela pessoa e não sente mais nada a não ser carinho. Isso é ter coragem de admitir que o amor acabou e que apenas restou afeto, amizade ou respeito. Coragem de desapegar e libertar, de cortar as correntes de uma vida que se perdeu num tempo que não volta mais.
Dizer adeus é preciso para que a nossa vida continue, para que as coisas fluam.
Ficar preso a uma ideia, a um conceito ou a um estado civil porque em tempos se fez juras eternas é permanecer morto quando a vida ainda nos vibra na pele e a fibra nos pulsa cá dentro. Ainda há tanto para dar! A gente tentou de tudo: deu volta ao mundo, abdicou dos sonhos, teve filhos, foi de férias para um lugar exótico… tudo em prol do sucesso de uma união que já sabíamos perdida desde o começo. Sim, porque o coração sabe.
O coração dá sinal de quando não estamos a fazer a coisa certa. Ele é esperto demais, o coração. Ele nos sussurra baixinho: “não é esse o caminho”. Mas o ego, comandado pelo medo, torce e distorce a realidade para que nos arrastemos numa corrente de areias movediças, com as pernas presas à vontade e aos desejos do outro. A gente ilude-se com os artifícios terrenos, com os jantares românticos, as prendas caras, as viagens espetaculares. A gente ilude-se com a beleza física e com a bondade do outro e não ouve o que realmente importa: o coração. O coração da gente sabe.
Só que a gente esquece-se de que o nosso coração avisou. A gente esquece-se de que não é feliz, mesmo sendo o outro um bom partido. Entramos no jogo do “deixa rolar”, para ver até onde conseguimos aguentar. Mas falta qualquer coisa! Não basta haver sintonia física e satisfação das necessidades básicas. É preciso sintonia espiritual. Querer as mesmas coisas, remar na mesma direção!
Por isso dizer adeus ao passado pode ser muito exigente. Às vezes temos que deixar boas pessoas e boas vidas para trás, passando a olhar para os nossos próprios anseios, dando asas aos nossos próprios sonhos, mesmo que o amanhã seja desconhecido.
Viver aprisionado a um passado porque nos fomos diminuindo ao longo do tempo e vendo no outro a tábua de salvação dos nossos problemas, pode virar uma grave doença da alma. E o que parece que foi tempo perdido foi na verdade uma bela aprendizagem: aprender a se amar em primeiro e a se libertar das amarras do ego. Aprender a libertar o outro, respeitando a felicidade dele, mesmo que o sofrimento inicial pareça arrebatador.
Dizer adeus ao passado permite-nos criar uma nova oportunidade de amar, mais feliz, mais equilibrada, mais em paz com aquilo que desejamos de verdade para as nossas vidas. Por isso siga em frente e diga com fé: eu consigo!
Liberte-se do passado. Diga-lhe adeus com dignidade.
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