Crescemos aprendendo que o certo é ser bonzinho. Que temos que nos trabalhar para levar tudo na esportiva, para não criticar as pessoas, para não sentir raiva, para ser doces o tempo inteiro, para reagir a ataques com paciência, compreensão e perdão, para não se irritar, para não elevar a voz, para ver sempre (só) o lado bom dos acontecimentos, para engolir sapos, enfim.
Ocorre que isso não faz bem. Tudo isso junto não tem como “dar bom”. Isso começa a sufocar.
As palavras não ditas começam a se acumular dentro do nosso ser. As raivas repreendidas, os desgostos disfarçados, as contrariedades represadas, tudo isso, depois de um tempo, começa a reverberar dentro do nosso corpo e vira um vulcão prestes a entrar em erupção.
Se realmente não fizermos nada, uma hora a coisa explode e o estrago pode ser desastroso. Física, emocional e/ou socialmente.
Não querendo nos indispor com os outros, acabamos nos indispondo conosco mesmos. Nós nos indispomos com o nosso coração, com a nossa alma, com a vida. E isso não é coisa que se faça!
Quantas vezes, querendo manter nossa postura de “boas pessoas”, não conseguimos dizer “não” para nada, não conseguimos defender nossos pontos de vista, não conseguimos manifestar as nossas vontades, não conseguimos fazer valer os nossos anseios?
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Então, mais vale não chatear os outros, mas viver frustrado, contrariado e amargurado?
Devemos ter em mente que as pessoas não têm como saber o que queremos se não nos manifestarmos. Que ninguém vai lutar pelos nossos sonhos se nós não fizermos isso pessoalmente. Que a vida é imprevisível e que, se adiarmos indefinidamente tomar as rédeas e escolher o nosso próprio caminho, pode ser que não dê tempo. Que pessoas felizes e bem resolvidas consigo mesmas e com as suas vontades conseguem ser bem legais com os outros também (talvez bem mais que os “bonzinhos”). Que nascemos para viver a nossa vida e não a dos outros.
Somos seres humanos. Sentir emoções dos mais variados tipos faz parte da nossa natureza. Se fossemos perfeitos, não necessitaríamos estar aqui, estar experienciando a vida. Precisamos SENTIR. Precisamos aprender a lidar com os nossos sentimentos. Evoluímos quando organizamos as dores, as angústias, as euforias, as raivas e as alegrias que, invariavelmente, emergem no nosso interior.
E como fazemos isso? Não negando as emoções que surgirem. Não as censurando. Não as enfiando para baixo do tapete.
Não nos culpando pelos sentimentos negativos. Não nos crucificando por não sermos bonzinho o tempo inteiro com os outros. Permitindo-nos ser amorosos conosco mesmos em todos os momentos, apesar de nem tudo ser luz dentro de nós em tempo integral.
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É claro que não precisamos sair atirando coisas nas pessoas. Não, não é esse o caminho, mas falar o que nos desagradou, de uma forma respeitosa, muitas vezes é necessário.
Revoltar-se e rodar a baiana alguma vez na vida, também. A maior parte das emoções não positivas pode ser processada e nos trazer alívio quando, simplesmente, as expressamos de alguma forma: escrevendo para si mesmo, contando a um amigo ou a um terapeuta, chorando, dançando, socando o travesseiro, fazendo exercícios físicos.
E, o mais importante: permitindo-nos SENTIR. Não nos cobrando sermos “santos”, super-heróis ou uma rocha dura e impenetrável. Não nos culpando por sentir, eventualmente, “coisas ruins”.
Acolhendo a nós mesmos e agradecendo por conseguir enxergar as nossas sombras e ter a oportunidade de transcendê-las. Amando-nos, de forma permanente e incondicional. Humanos, enfim.
Direitos autorais da imagem de capa: Taisiia Stupak/Unsplash.