Quem já fez uma viagem internacional de muitas horas conhece o que seja jet lag.
Para quem desconhece o termo, a explicação mais simples o define como o desconforto causado pela mudança abrupta no ritmo de vida da pessoa, pelas alterações de luz (horário de dormir e alimentar-se), temperatura, fazendo com que o sincronismo do corpo humano fique confuso.
Acaba-se ficando com sono quando é dia; sem fome nos horários das refeições e acordado quando se deveria dormir e se recompor. Não porque se queira, mas porque o sol define, diferentemente do ritmo diário a que se está acostumado, o dia e a noite no destino de viagem.
É a diferença de fuso horário. E, como consequência, irritação, cansaço, insônia etc.
Algumas pessoas sofrem mais, outras menos. Uns dormem nos voos, outros não, e ainda assim passam incólumes por estas diferenças no ritmo circadiano. Há as que, para aproveitar a viagem, inicialmente não ligam para essas alterações de horários, vindo sofrer as consequências no retorno para casa, normalmente com um mal-estar forte, febres e cansaço sem motivo aparente.
Mas, quem de nós nunca sofreu um jet lag da vida, mesmo sem ter viajado? Quem não sentiu aquela sensação de que você e o ritmo do mundo não combinam? Que a humanidade está seguindo em frente e você está estacionado ou andando de ré?
Muitas vezes nós nos encontramos tão desconectados do ritmo superior que temos a impressão de ser colocados em um cenário de cinema, com o chroma key ligado, e alguém (não se sabe quem) acrescentando imagens e situações totalmente fora do nosso alcance e vontade. Como se nos sentássemos no sofá de casa ou num banco de praça e a vida passasse ao nosso redor. Não a sentimos. Não a vivemos.
Comer e dormir são mandamentos fisiológicos, mecânicos. Não há proveito ou gozo. Inexiste alegria ou tristeza. Só indiferença. Um jet lag do corpo, da mente e da alma.
Há quem fique neste estado de jet lag por muito tempo, esperando uma turbulência que o desperte novamente para a vida. Há quem o perceba como um aviso de que algo está anormal em sua vida e que se é imprescindível haver mudanças, desafios ou novos ares.
Por outro lado, existe também o jet lag do amor. Esse nos tira totalmente do ritmo normal, provoca taquicardia, deixa-nos sem fome ou sono.
Mas, quem se lembra de comer e dormir quando está apaixonado? Quem precisa comer e dormir se está amando? A cara de lorpa e o olhar perdido fazem também parte do pacote “paixonite”. Sem contar um sorriso estranho nos lábios.
O ritmo cardíaco passa a ser ditado pela visão do ser amado. Pela expectativa do encontro, da mensagem virtual. A fome, ditada pela ansiedade do estar com, do conviver. O sono, ah este sim, vira uma experiência transcendental quando estamos apaixonados. É possível se perder em devaneios, conjecturas e infinitos planos.
Para cada tipo de jet lag recomenda-se um remédio. Para o causado por viagem, alimentação frugal no período próximo a viagem; pequenas mudanças no comportamento para acostumar o corpo às novas mudanças, entre outras.
Para o jet lag de alma, terapia. Profissionais que auxiliem a sair do estado de torpor e se recolocar na própria vida. Ativar o botão LIGADO nas suas próprias decisões.
Agora, para o jet lag do amor não há remédio ou terapia. Deve ser vivenciado, refletido, sentido. Deve ser introspectivo e ao mesmo tempo externalizado. Deve ser aproveitado e ainda que sofrido, vivido. Não há fuso horário, voo atrasado, avião perdido. Não há bagagem a reclamar. Há destino, linha de chegada e futuro.
E se o amor não der certo, o jet lag da alma muitas vezes se fará presente. Insônias, mal-estares, dores. Contudo não tem problema. Quando houve amor a viagem foi completa.
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Direitos autorais da imagem de capa: Nils Nedel on Unsplash